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Fundação de Roma: A Lenda

VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE: PRIMEIRA CAPITAL DE MATO GROSSO

terça-feira, 1 de dezembro de 2020 · 0 comentários

 


                                 

CEJA PROF. ALFREDO MARIEN

PROJETO PEDAGÓGICO- 2012

DISCIPLINA: HISTÓRIA

ÁREA: HUMANAS

 


 

VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE: PRIMEIRA CAPITAL DE MATO GROSSO

 

 

 

 

Trabalho apresentado ao Centro de Educação de Jovens e Adultos Prof. Alfredo Marien como um dos requisitos avaliativos na disciplina de História, elaborado sob a orientação da Professora Maria Aparecida Gonçalves.

 

 

 

 

 

Rondonópolis

2012

 

Agradecimentos

 

Agradecemos primeiramente a Deus, que sem ele esse trabalho não seria possível.

À professora Maria Aparecida Gonçalves, orientadora do projeto, agradecemos as valiosas contribuições, compreensão e dedicação.

Ao Exce. Deputado Mauro Savi.

 


Índice:

1 - Objetivos.................................................................................................................05

2 – Considerações Iniciais............................................................................................06

3 – Capítulo I: Vila Bela e seus aspectos históricos e atuais............................................07

4 – Capítulo II: Cultura de Vila Bela...........................................................................12

7 – Considerações Finais..............................................................................................20

8 – Grupo de Pesquisa..................................................................................................21

9 - Anexo......................................................................................................................23

10– Fonte de Pesquisa..................................................................................................25


OBJETIVOS

 

♦ Despertar interesses pelo conhecimento dos aspectos históricos desse município, por meio de pesquisa e trabalho representativo.

♦ Mostrar a importância de Vila Bela da Santíssima Trindade no cenário mato-grossense do século XVIII e atualidade.

♦ Representar por meio de trabalho audiovisual município de Vila Bela da Santíssima Trindade. 


CONSIDERAÇÕES INICIAIS

 

Nós moradores de Mato Grosso, nascidos aqui ou imigrantes, pouco sabemos sobre esse lugar tão maravilhoso que tem despertado interesses de pessoas do Brasil inteiro e que vem alavancando o turismo local.

Os estudos desenvolvidos ao longo desta pesquisa, focalizando os períodos de 1752 e na atualidade da primeira capital de Mato Grosso no século XVIII, Vila Bela da Santíssima Trindade destaca-se pela sua população, composta de grande número de afrodescendentes.

Vila Bela foi a primeira capital de Mato Grosso, sendo durante muito tempo área de conflito entre os Portugueses e os Espanhóis, que se enfrentaram militarmente na região inúmeras vezes. As ricas minas de ouro de Vila Bela alimentaram com ouro a Europa durante muito tempo e por este motivo, milhares de africanos escravizados foram levados para lá, trabalhando duramente, até a morte ou a fuga para o sertão, onde criavam Quilombos e desenvolviam pequenos reinados.

Para a elaboração deste breve histórico sobre o município de Vila Bela da Santíssima Trindade, Estado de Mato Grosso, buscamos referências em estudos realizados por, João Carlos Vicente Ferreira, Paulo Pitaluga Costa e Silva, Elizabeth Madureira, Janaína Facchinetto.
CAPÍTULO I

Vila Bela da Santíssima Trindade e seus aspectos históricos e atuais

 

Vila Bela da Santíssima Trindade é um município que está situado na região Sudoeste de Mato Grosso (Fig.01), distante de Cuiabá 525 km. Segundo dados da prefeitura, sua extensão territorial é de 12.179,43 km2  e atualmente possui uma população aproximada de 14.105 mil habitantes (IBGE/2010).

A região de Vila Bela da Santíssima Trindade inicialmente era habitada pelos indígenas da tribo Parecis dos quais ainda hoje existem alguns remanescentes. Segundo estudos feitos sobre a origem do povo não se tem nada realmente comprovado.

Quando os portugueses tiveram os primeiros contatos com os indígenas, ouviram-nos pronunciarem a palavra “San Miguel”, o que demonstrava já terem entrados em contato com o homem branco.

Segundo Paulo Pitaluga, a História da ocupação de Vila Bela remonta do século XVIII. mas, os espanhóis chegaram na região a partir de 1547.

João Carlos Vicente Ferreira, no livro Mato Grosso e seus Municípios, aborda as ações dos irmãos Fernando e Artur Paes de Barros que foram os descobridores das Minas do Mato Grosso, nas margens do Rio Galera, no Vale do Guaporé.

Nessa expedição se depararam com uma mata grossa, fechada, com altas árvores, quase impenetrável, que se estendia por quase sete léguas. Denominaram-na de Mato Grosso.

Contudo, posteriormente, em 1746, através de Carta Régia, D. João V determinou a fundação de uma vila nessa região, para servir de ponto de apoio administrativo e militar aos vários pequenos garimpos pulverizados por todo o Vale do Guaporé. 

Mato Grosso inicialmente ainda não era uma capitania, ficando sob os cuidados do capitão-general Rodrigo César de Menezes da capitania de São Paulo, somente no ano de 1748, é criada a Capitania mato-grossense, o que segundo o historiador João Carlos, essa se deu por meio da Carta Régia de 9 de maio de 1748, sendo convocado como representante da Coroa portuguesa D. Antônio Rolim de Moura, sendo o mesmo nomeado o primeiro Capitão General da nova capitania. Para garantir a posse portuguesa no Vale do Guaporé, Rolim de Moura fundou Villa Bela da Santíssima Trindade a 19 de março de 1752, como a primeira capital mato-grossense. Vale lembrar, que a planta da nova capital foi projetada em Portugal, sendo a primeira cidade brasileira planejada.

Ainda segundo, João Carlos, o nome do local onde foi fundada a vila, nas margens do Rio Guaporé era conhecido como Pouso Alegre, foi escolhido o ponto mais ocidental possível do então reino português, para instalar a nova sede da Capitania pelas condições propícias de terreno, solo e possibilidades de defesa. 

Contudo, era difícil o acesso á capital, o suprimento das necessidades dos moradores e de escravos era feito pela Companhia de Abastecimento Grão-Pará e Maranhão, por via fluvial, passando pelos rios Guaporé, Madeira, Amazonas, até entrar no Oceano Atlântico, retornando para Portugal abastecido com ouro e pedras preciosas, etc.

Segundo a pesquisa de Janaína Facchinetto, o plano urbanístico da vila foi elaborado em Portugal (fig. 02), e os projetos das residências (fig. 03), no Rio de Janeiro, porém, ambos tiveram que ser adaptados a realidade local, tais como as elevadas temperaturas, distancia e dificuldade de acesso. Os projetos das casas tiveram de ser simplificados: os sobrados se tornaram casas térreas e foram alargadas, as estruturas tiveram de ser reforçadas por causa do solo e a dificuldade da chegada de materiais nobres fez com que os construtores optassem por usar materiais oriundos da região, como pedras, pau a pique e cobertura de capim. Apenas duas regras eram exigidas: que o traçado retilíneo das ruas fosse mantido, essas com 70 palmos de largura, e que as casas fossem construídas no alinhamento frontal dos terrenos. As construções seguiam o padrão das casas coloniais do século XVIII, retilíneas, com grandes portas e janelas, paredes grossas e telhado com queda de quatro águas. 

O plano previa ainda a construção de dois grandes prédios: a Igreja Matriz (Fig. 04) - Tombada como patrimônio histórico em 1988 - e a Residência dos Governadores, construídos a duras penas pelos escravos. As construções eram de pedra Canga, adquiridas na região. Tão amplas as proporções dos prédios que as construções foram interrompidas várias vezes, por escassez de material ou falta de recurso.

Apesar das dificuldades, no final de 1952, mesmo ano do início das construções, a vila já contava com 16 casas erguidas e em fase de acabamento.

  Contudo, no  início do século XIX,  Cuiabá atraía para si a sede da capitania, e Vila Bela recebia o título de cidade sob dominação de Mato Grosso. Em 28 de agosto de 1835 Cuiabá é transformada em capital e Vila Bela passou às ruínas.

Com o abandono de Villa Bela pelos brancos, os negros construíram inúmeros quilombos nas imediações, com medo de ocupar a cidade e serem pegos desprevenidos numa volta repentina dos brancos. Nesses quilombos faziam plantação de subsistência e praticavam a cultura e religião de acordo com suas crenças. Villa Bela foi complemente abandonada à própria sorte, passando as ruínas. 

Apenas 70 anos após a partida dos brancos os negros ocuparam a cidade, dividindo entre si as antigas casas da elite portuguesa.

A decadência da cidade Mato Grosso foi tão sensível, que a Assembléia Legislativa editou, em 1878, uma lei extinguindo o município, que foi, no entanto, vetada a 11 de dezembro do mesmo ano, pelo presidente da Província Dr. João José Pedrosa. 
A Lei Estadual nº 4.014, de 29 de novembro de 1978, devolveu a denominação antiga ao município: Vila Bela da Santíssima Trindade.

O cotidiano da cidade é pacato. Pessoas caminham tranquilamente pela rua, se instalam na praça em rodinhas de conversa, quase indiferentes à beleza das ruínas que toma todo o centro da praça. 

O traçado urbano é regular, com quadras retangulares e, como a maioria das cidades interioranas, seu movimento gira em torno de uma praça central, onde está instalado o comércio local, composto por pequenas lojas de variedades (roupas, objetos para casa), armazéns e farmácia (Fig. 05).

Sem uma estrutura turística apropriada, a economia de Vila Bela é estagnada. Quando terminam os estudos, os jovens saem da cidade em busca de emprego, ou ficam e “se viram” como podem. Apesar da pobreza e falta de perspectiva futura, o índice de roubo na cidade é quase zero. O que mais se ressalta é a alegria, a amizade e o compartilhar. A solidariedade é marca mais forte desse povo. 

Atualmente, a maioria das casas construídas são de tijolos nus, com esquadrias simples de madeira, telha de barro, beirais estreitos (fig. 06). Fora as ruas que ladeiam a praça, revestidas por paralelepípedo, as demais são de terra batida cujo pó colore as residências e calçadas.  Imponente no centro da praça, a enorme ruínas da antiga igreja serve de fundo para a cidade. Sob ela, a vida corre mansa. E sobre ela, em 02 de maio de 2006, foi inaugurada uma cobertura de estrutura metálica e proteção em policarbonato, a fim de protegê-las da ação do tempo e dos vândalos (Fig. 07). É uma medida emergencial tomada pelos governantes para conter o deterioramento das ruínas que, segundo estudos, não resistiria por mais dez anos. No mesmo dia, foi inaugurado o Museu Aberto, que nada mais é do que a transformação da igreja num espaço de exposição aberto, provocando um intercâmbio de conhecimento entre as ruínas e a cidade.  

É o inicio da restauração de Vila Bela da Santíssima Trindade, após 161 anos de descaso público. 

 

 

 


CAPITÚLO II

CULTURA DE VILA BELA

A festança do Divino

A festa do Divino (Fig.08) realizada uma vez por ano a fim de homenagear o Divino Espírito Santo, a Santíssima Trindade e as Três Pessoas, padroeira do lugar.

É uma grande festa, dividida em duas partes: a preparação, caracterizada por reza, folia, levantamento do mastro e alvorada dançante; a segunda, os rituais, que são reza solene (missa), sorteio dos novos festeiros e os banquetes do dia (almoço e jantar). 

A banda acompanha toda peregrinação. A festa gira em torno de duas bandeiras: a pobre e a rica. A bandeira pobre é levada pelo Alferes da Bandeira, e somente ela pode cruzar todo o município, zona rural e urbana. Quando chega na moradia, a bandeira pobre é recebida com festa e alegria. Comida, bebida e pouso são oferecidos aos que acompanham a marcha, e ganham oferendas para a festa. A bandeira rica é levada pelo Capitão do Mastro, e apenas pode desfilar na zona urbana, porém ela só entra na residência se for chamada, pois é necessário dar algum tipo de prenda em troca de receber a bandeira em sua casa.

Quando as bandeiras se encontram, são unidas e levadas pelo cortejo até a igreja Matriz, onde são hasteadas ao som de cânticos e rezas. A intenção é proteger todo o Vale, permitindo que o fluxo da vida prossiga nas graças do Santo. 


Dança do Chorado

Também chamada de a “Dança das Cozinheiras”, o Chorado (Fig.09) acontecia com frequência durante qualquer ocasião festiva em Vila Bela e nas comunidades rurais do entorno. Dizem que a incorporação do Chorado, como atividade oficial da Festança, ocorreu a partir de 1982, quando foi criado e estruturado o Grupo do Chorado, inclusive com o resgate de antigas músicas e coreografias.

Pelo menos três visões distintas sobre o Chorado circulam em Vila Bela. A primeira é de que ele era um artifício utilizado pelas escravas que habitavam ou trabalhavam junto às casas dos patrões, para manter os mesmos, mais benevolentes e em alguns casos conquistar através da dança favores especiais, principalmente o perdão ou a diminuição de castigos corporais aplicados em outros escravos.

 

A segunda visão é de que as mulheres que trabalhavam nas festas de santos e na própria Festança, produzindo as refeições comunitárias do povo, não tinham tempo de participar dos festejos e por isso, quando as festas acabavam, elas promoviam o “mocororó” (“a rapa da panela”, “o restinho da rapagem”) ou seja, uma confraternização geral entre as equipes da cozinha, animada pelo Chorado, inclusive com a participação de homens que batucavam, cantavam, dançavam e sapateavam. A bebida do “mocororó” era conseguida através da captura de homens curiosos ou velhos conhecidos que passavam nas imediações das cozinhas ou casas. A captura se dava através da laçada do pescoço do mesmo com um lenço comprido que as mulheres do Chorado sempre têm a mão. O homem é puxado com vigor ate o interior do recinto onde ocorre o “mocororó”, normalmente as cozinhas e varandas internas. Lá ele é cercado pelas mulheres que dançam e cantam “esse irimão (irmão) vai pagar, esse irimão vai pagar”. Se o homem desembolsa algum dinheiro e repassa as dançarinas ele é imediatamente solto e as mulheres cantam “homem que tem dinheiro, deita na cama e carinho nele, carinho nele”. Se o homem se recusa a pagar ou não tem dinheiro elas cantam enfezadas “homem que não tem dinheiro, deita na cama e porrete nele, porrete nele”, e ele é solto e esquecido.

A terceira visão é a de que o Chorado era uma das formas de diversão e integração da comunidade incorporada por todos, homens e mulheres com ritmo mais lento e sensual que animava todos os tipos de festas e celebrações e que agora se transformou num símbolo de manifestação cultural do gênero feminino vilabelense. O Chorado foi recriado através de pesquisas com as mulheres mais velhas e transformado no Chorado atual, folclórico e encantador, incorporando ritmos e músicas do batuque e do tambor.

Atualmente, o Chorado está organizado através da Associação da Dança do Chorado de Vila Bela (ADCVB) fundada em 2001, cuja Presidente é Zózima Frazão de Almeida, cantora do grupo e capelona. Abrange cerca de 25 dançarinas, 1 coordenador, 3 cantoras e 2 músicos, utiliza 1 violão e 2 atabaques como instrumentos musicais. A indumentária é festiva, longo vestidos colorido, muitos colares, um lenço comprido, enfeites no cabelo e uma garrafa de kanjinjin para as coreografias dançadas com a garrafa na cabeça. Quase todas as dançarinas são mulheres de meia-idade ou até idosas, não sendo bem vindas as jovens. O Chorado se apresenta em quase todos os eventos públicos que ocorrem na Vila Bela e também, em eventos particulares, podendo ser contratado para isso.

Durante a Festança, o Chorado ocupa uma posição nobre, pois se apresenta no tempo e espaço originalmente destinado ao Congo, ou seja, logo após o final da Missa Solene em ação de graças ao Glorioso São Benedito. Isso gerou uma grande polêmica e um contínuo enfrentamento, principalmente com o Grupo do Congo, que até hoje lamenta o tempo e espaço perdido, alegando que o Chorado não faz parte da tradição devocional e, portanto, não deveria se apresentar no auge da Festa de São Benedito. Alegam ainda, que a apresentação do Congo após a missa, ficou prejudicada por ter menos tempo para a dramatização e também em função do horário ser muito adiantado e o sol estar muito forte, incomodando os festeiros, principalmente os idosos, as autoridades, o público nas arquibancadas e os próprios dançantes que têm que se esforçar mais em função do calor. 


A Dança do Congo

Apesar de ser vista como uma dança, o Congo (Fig. 10) representa mais que isto. O Congo é o guardião de São Benedito, sem o qual os festeiros e os instrumentos rituais que representam o Santo e a Irmandade não podem sair às ruas. Os figurantes do Congo são Soldados da fé, devotos que saem às ruas armados de espadas, com postura militar para escoltar o Santo, demonstrando sua crença e devoção a toda a comunidade.

Através das músicas, comunicam-se com os festeiros e com o público, homenageiam a Irmandade e alegram a comunidade.

O Grupo do Congo é formado por 27 homens adultos e um pré-adolescente, que desempenham as funções de: Rei; Príncipe; Secretário de Guerra; Embaixador; 2 Guieiros; 8 Músicos; 14 Soldados. Conforme o Rei do Congo existem ainda 1 Camareiro e 4 Soldados da Reserva.

Atualmente estão organizados através da Associação da Dança Cultural do Congo (ADCC), criada em 2000 (CNPJ 03.840.441/0001-90), cujo Presidente é o Sr. Joaquim das Neves Fernandes Leite.

O Grupo apresenta-se com indumentária especifica chamada de fardamento, que consiste de camisas de manga comprida, eventualmente camisetas; calça comprida; botinas de couro; capas compridas; faixas peitorais, capacetes com penas de ema; chapéus enfeitados; escudos peitorais; espadas de madeira; cincerros; coroa e bastão de mando.

A função específica do Congo é a de buscar e reunir todos os festeiros de São Benedito, levá-los a missa, buscá-los de volta ao final e com todos os festeiros e familiares reunidos, assim como as autoridades e o povo em geral, apresentar um teatro dramatizando a história do confronto entre o Reinado do Congo simbolizado pelo Rei, seu filho, o Príncipe e seu Secretário de Guerra, e o Reinado de Bamba simbolizado pelo Embaixador e seu exército com 24 Soldados, que ao final são subjugados ao Reinado do Congo pela força e depois pelo milagre de São Benedito.

Após a apresentação, o cortejo com os festeiros e uma pequena multidão são escoltados pelo Congo até a casa da Rainha onde todos são recepcionados com uma chuva de confetes, Chorado, bezéques, muita alegria e confraternização. Logo após, todos se dirigem sob a escolta do Congo ao Centro Comunitário, oferecido pela Rainha. Após o almoço o Congo reinicia a escolta do cortejo de festeiros, entregando o Rei, a Juíza, o Juiz, e as Ramalhetes.

No dia seguinte, há a mesma função de buscar os festeiros e levá-los para a missa, onde serão proclamados os festeiros da próxima festa. Neste dia o trabalho é dobrado, pois o Congo tem que buscar os festeiros atuais e os futuros festeiros, o que aumenta muito o itinerário e o esforço desprendido.

Após a Missa Afro, onde é feita a proclamação e transferência simbólica dos cargos aos novos festeiros, o Congo escolta o cortejo dos festeiros à casa da Juíza e depois ao Centro comunitário para o almoço oferecido pela mesma. Após o almoço o ritual de entrega dos festeiros continua até que todos sejam entregues, o que acontece até o início da noite. Depois disso o Congo se dirige ao pátio frontal da Igreja Matriz onde, junto com uma multidão, cantam e dançam encerrando a festa de São Benedito. 

Dança do Congo: Status e Função

Rei  -  Escolhido pelo próprio grupo do Congo com possíveis interferências da Irmandade de São Benedito. Tem cargo vitalício, mas pode ser substituído por motivo de saúde, velhice, mudança para outra cidade ou por algum conflito interno grave.

O Rei manda simbolicamente em todo o Reinado, incluindo-se aí, todos os Soldados, o Príncipe, o Secretário e o Embaixador de Bamba. Ele é o responsável pelo bom andamento da dança. Preenche as vagas para os “figuras” do Congo, e coordena os ensaios juntamente com o Embaixador. Atualmente, o Rei também é Presidente da Associação do Congo e dirige o “Conguinho”, grupo numeroso de meninos que estão aprendendo a dançar o Congo, tendo já se apresentado em um ou dois eventos públicos em Vila Bela.

Conguinho de Vila Bela

Kanjinjin (Príncipe)  -  Pré-adolescente escolhido pelo Rei, após consultas ao Grupo do Congo e à Irmandade. O Príncipe representa o filho do Rei, o herdeiro do Reinado. Dele se espera valentia, seriedade, obediência e a valorização das tradições.

O Príncipe pode perder seu cargo por diversos fatores como desobediência contínua, comportamento anti-social. Normalmente ele perde o cargo quando entra na adolescência ficando muito grande para representar o papel de Príncipe.

Secretário de Guerra  -  Escolhido pelo Rei entre os figuras do Congo, o Secretário é o braço direito do Rei, tendo papel de destaque na dramatização. Protagoniza várias falas e combates e ao final, vence os soldados inimigos através de um feitiço do Rei e da fé a São Benedito.

Embaixador de Bamba  -  Escolhido pelo ex-Embaixador ou por algum complô interno, o Embaixador é o dono dos Soldados. Juntamente com o Rei, define os itinerários na busca dos festeiros, comanda os Soldados, cobra disciplina e fervor, corrige as músicas e coreografias e determina punições quando necessário.

Guieiros  -  São os dois figuras ou Soldados que vão na linha de frente do Congo. São responsáveis pelo alinhamento do grupo, são “tiradores” das músicas, ajudam o Embaixador com o traçado do itinerário e deslocamento em busca dos festeiros. Seriam os sucessores naturais para o cargo de Embaixador, mas nem sempre isso acontece. 

Músicos  -  São oito figuras ou Soldados que tocam respectivamente: dois chocalhos, dois ganzás, dois bumbos e dois cavaquinhos, fornecendo acompanhamento musical para as cantigas do Congo.

Soldados  -  São dezesseis figuras chamados também de Soldados ou Dançantes, incluindo-se aí, os “Guieiros”. São escolhidos pelo Rei ou assumem alguma “vaga” familiar em substituição a algum parente em caso de morte, doença ou velhice.

Tem que ser negros, de família tradicional, beber pouco, serem devotos de São Benedito, ter boa voz e saber cantar, além de ter boa resistência física e obedecerem sem discussão a hierarquia do Congo.

Bebidas Típicas

 Kangingin (Fig. 11) é uma bebida produzida pelos negros no município de Vila Bela da Santíssima Trindade. É o único local de Mato-Grosso que produz o Kangingin. Dizem ser afrodisíaca, licorosa, revigorante e com sabor acre. Afirmam alguns, ser muito boa pra velho e quem está fraco e sem força para o amor. É muita usada nas festas. Essa bebida ainda é herança do tempo dos escravos.

É um licor feito com raízes e ervas do Vale do Guaporé, antigamente bebido apenas pelos dançarinos da festa do Congo e de São Benedito. Era uma forma de repor as energias, visto que os dançarinos começavam a dançar às 04 horas da manhã e só paravam por volta de 21 horas, quando ainda tinham que participar dos bailes populares. 

Esquenta Xeréca licor energético de progênie africana, nascido em Vila Bela da Santíssima Trindade em 2002, Xeréca é o nome de um instrumento musical africano, e para homenagear a população nativa que é maioria negra, através da sugestão de um percusionista que é considerado um dos maiores do mundo, batizamos o licor no aniversário dos 250 anos da cidade.

 


Considerações Finais

 

Por meio da proposta desenvolvemos o estudo e pesquisa sobre as peculiaridades do município englobando seus aspectos históricos do período de 1752 a atualidade. Para fins de estudo, dividimos a turma em três grupos, onde cada um pesquisou um tema que ao final da pesquisa foi montado esse texto aqui apresentado e uma apresentação aberta à comunidade escolar e localidade.

Nosso trabalho teve como base de pesquisa as fontes bibliográficas e online sobre localização, e aspecto histórico, levantamento de arquivos fotográficos. Esses dados bem como todo levantamento histórico e sócio cultural foram colocados em painéis e slides na apresentação ao público estudantil do Centro de Educação de Jovens e adultos “Prof.” Alfredo Marien e demais comunidades no dia 17 de dezembro de 2012.


Grupo de pesquisa (Fig.12)

 

Professora regente: Maria aparecida Gonçalves

 

Turma: 1ºC Fundamental – Matutino

Antônio Barauna de Souza

Denise Kaline Oliveira sturmer

Heldon Aparecido de Melo

Iracy de Oliveira

Janaina Lima da Conceição

Marcelo dos Santos Vasconcelos

Márcia Mathias

Maria José Lansone da Silva

Maria José de Oliveira

Paulo Sérgio Machado

Selma Aparecida de melo

Sônia Maria dos santos

Valeska Lenuzia dos santos

Vanei Rita dos Santos

Wallace Ricardo Soares Dias

Wilson Coimbra de Lima


ANEXO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


FONTES

 

LIVROS

FERREIRA, João Carlos Vicente. Paulo Pitaluga Costa e Silva. Breve História de Mato Grosso e seus Municípios, Cuiabá, 1994.

FERREIRA, João Carlos Vicente. Mato Grosso e seus municípios. Cuiabá: Secretaria de

Estado de Educação, 2001

MADUREIRA, Elizabeth Madureira. História de Mato Grosso: Da ancestralidade aos dias atuais: entrelinhas, Cuiabá, 2002.

VILELA, Mário.  Festança de Vila bela da Santíssima Trindade. Cuiabá: Secretaria do

Estado de Comunicação social, 2002.

 

ONLINE

http://projetoparaleloquinze.blogspot.com.br/2011/04/o-congo-de-vila-bela.html

Janaína Facchinetto. http://www.arteecidade.ufba.br/p_JAF.pdf -visitado no dia 29/11/2012 as 09:00

                                                                                     

 

TCC - ROMARIA DOS MÁRTIRES EM RONDONÓPOLIS - MATO GROSSO: 1992-2006

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO – UFMT

CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE RONDONÓPOLIS – CUR

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS – ICHS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ROMARIA DOS MÁRTIRES EM RONDONÓPOLIS - MATO GROSSO: 1992-2006

 

 

Maria Aparecida Gonçalves

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Rondonópolis - MT

2007


Maria Aparecida Gonçalves

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ROMARIA DOS MÁRTIRES EM RONDONÓPOLIS - MATO GROSSO: 1992-2006

 

 

 

 

 

 

Monografia apresentada ao Departamento de História, do Instituto de Ciências Humanas e Sociais, do Campus Universitário de Rondonópolis, da Universidade Federal de Mato Grosso, como um dos requisitos para a obtenção do título de Licenciada em História, elaborada sob a orientação da Professora Drª. Maria Elsa Markus.

 

 

 

 

 

 

 

 

Rondonópolis - MT

2007


Maria Aparecida Gonçalves

 

 

 

 

 

ROMARIA DOS MÁRTIRES EM RONDONÓPOLIS - MATO GROSSO: 1992-2006

 

 

Monografia submetida à Comissão Examinadora designada pelo Curso de Graduação em História como requisito para obtenção do grau de Licenciada em História.

 

Rondonópolis/Fevereiro/2007.

 

 

 

BANCA EXAMINADORA

 

 

 

 

 

__________________________________________________

Profa. Dra. Maria Elsa Markus (orientadora)

Universidade Federal de Mato Grosso – Rondonópolis-MT

 

 

 

__________________________________________________

Pe. Giovane Pereira de Melo (examinador convidado)

Pároco da Paróquia Nª. Sª. Aparecida – Rondonópolis-MT

 

 

 

 

 

 

 

 

 


AGRADECIMENTOS

 

 

Assim como todo trabalho científico, este não poderia ter sido realizado de forma isolada e sem a colaboração de professores e de tantas outras pessoas que, direta e indiretamente, prestaram sua colaboração.

Em primeiro lugar agradeço a Deus, por Sua presença em minha vida e, especialmente, durante a realização desse trabalho.

Aos meus pais: Aldegundes José Gonçalves (in memorian) e Terezinha Maria Gonçalves. À minha mãe, em especial, que sempre esteve ao meu lado, incentivando-me.

À Profª. Drª. Maria Elsa Markus, que soube lidar com minhas limitações e por ter me aceitado como sua orientanda.

Aos meus filhos: Igor Leonardo G. de Oliveira e Itamar Eduardo G. de Oliveira, pela tolerância, carinho, apoio e compreensão, nos momentos mais difíceis do curso.

Aos meus irmãos, em especial à minha irmã Marlene Gonçalves, pela compreensão e incentivo para que eu chegasse ao término do Curso de Graduação, de Licenciatura Plena em História.

Ao meu querido sobrinho Fabrício Gonçalves, por sua colaboração durante este trabalho.

À professora Laci Maria Araújo Alves, que fez de suas aulas momentos de grande aprendizagem.


RESUMO

 

O presente estudo foi construído por meio de diversas fontes. Ele tem por objetivo conhecer um pouco melhor, bem como fazer um registro sobre a Romaria dos Mártires, que vem ocorrendo em Rondonópolis-MT. Temporalmente, abrange o período que compreende os anos de 1992, ano este, em que ocorreu a primeira Romaria, e 2006, ano da sua décima quinta edição.

 



A

ALN

Ação Libertadora Nacional..................................................................................................................................................... 73

AMPDF

Associação Mundonovense dos Portadores de Deficiência Física......................................................................................... 76

B

BA

Estado da Bahia...................................................................................................................................................................... 78

C

CE

Estado do Ceará............................................................................................................................................................... 73, 74

CEBs

Comunidades Eclesiais de Base........................................................................................................................... 10, 36, 71, 72

CF

Campanha da Fraternidade..................................................................................................................................................... 49

CPT

Comissão Pastoral da Terra.................................................................................................................................................... 71

CUR

Campus Universitário de Rondonópolis............................................................................................................................ 0, 15

D

DF

Distrito Federal...................................................................................................................................................................... 77

DOI-CODI/SP

Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa.................................................................... 73

F

FUNAI

Fundação Nacional do Índio...................................................................................................................................... 20, 21, 78

I

ICHS

Instituto de Ciências Humanas e Sociais............................................................................................................................ 0, 15

J

JEC

Juventude Estudantil Católica................................................................................................................................................. 73

M

MG

Estado de Minas Gerais......................................................................................................................................................... 69

MST

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.................................................................................... 22, 24, 26, 36, 76, 84

MT

Estado de Mato Grosso.... 0, 1, 2, 4, 8, 9, 12, 13, 15, 16, 17, 18, 19, 22, 24, 26, 33, 34, 38, 40, 50, 57, 58, 68, 69, 81, 83, 84

O

ONU

Organização das Nações Unidas............................................................................................................................................ 77

P

POLOCENTRO

Programa de Desenvolvimento dos Cerrados........................................................................................................................ 25

PROTERRA

Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste................................................... 25

S

SUDAM

Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia............................................................................................................. 25

T

TRF

Tribunal Regional Federal...................................................................................................................................................... 78

U

UDR

União Democrática Ruralista.................................................................................................................................................. 77

UFMT

Universidade Federal de Mato Grosso............................................................................................................................... 0, 15

UNE

Congresso da União Nacional dos Estudantes....................................................................................................................... 73

USP

Universidade de São Paulo.................................................................................................................................................... 73



CONSIDERAÇÕES INICIAIS

 

Quando foi dito na sala de aula que a Monografia é uma disciplina obrigatória do Curso de Graduação, de Licenciatura Plena em História, e que o estudante para terminá-lo deveria, ao seu final, entregar um estudo monográfico sobre um tema que tivesse relevância social e científica, daí veio o desespero, pois eu não sabia o que pesquisar. Isto, porque passei grande parte da minha vida cuidando de casa, marido e filhos, resultando daí que eu não lia muito, dedicando-me pouco aos estudos. Para falar a verdade, não lia quase nada, estando presa ao meu “mundinho” do lar. Somente voltei a estudar quando meu primeiro marido saiu de casa, após a nossa separação.

Contudo, há algo em minha vida além da minha família, a que me dedicava e a que ainda me dedico: a religião pela qual fiz a minha opção, ou seja, a religião Católica.

Lembro-me que quando meus oito irmãos e eu éramos crianças, a minha mãe, dona Terezinha Maria Gonçalves, que tomava conta da Paróquia São João Batista em Guiratinga, Estado de Mato Grosso, ensinou-nos a participar das missas e dos eventos da Igreja Católica.

Dessa forma, cresci vivenciando ativa participação religiosa. Depois de três anos de casada mudei para Rondonópolis – Mato Grosso, onde continuei participando dos eventos católicos na Catedral Santa Cruz, localizada no bairro Santa Cruz. Hoje, participo da Paróquia Bom Pastor, localizada no bairro de igual nome, porque mudei de bairro e ela fica próximo à minha residência, no bairro Jardim dos Pioneiros, portanto, próximo à Paróquia já citada.

Foram minhas experiências religiosas que me levaram a pensar que talvez eu pudesse trabalhar sobre uma temática ligada à religiosidade.

Em 1992, aconteceu a primeira Romaria dos Mártires, na cidade de Rondonópolis-MT, e como já disse, sempre procurei participar de celebrações e eventos realizados pela Igreja Católica. Assim sendo, não foi diferente em relação ao evento ora assinalado. Dele, tenho participado quase todos os anos, tendo faltado somente algumas vezes por motivos muito sérios. Daí ter pensado em fazer a minha pesquisa sobre essa Romaria. Contudo, eu não sabia se poderia, pois como já mencionei, de acordo com alguns professores com quem conversei e com estudiosos que tratam sobre a pesquisa, o tema a ser pesquisado deve ter relevância social e científica. Seria o tema que pensei desenvolver um tema relevante? A quem ele seria relevante? Por quê? Para quê?

Com essas indagações, procurei a professora doutora Maria Elsa Markus e perguntei a ela se poderia ser a minha orientadora. Escolhi-a pela seriedade com que ela faz o seu trabalho em sala de aula, pois já fora minha professora em duas disciplinas: Métodos e Técnicas de Pesquisa e Teoria da História. E, como ela aceitou, perguntei-lhe se poderia elaborar um projeto de pesquisa que tivesse como tema a Romaria dos Mártires. Ela me disse que sim, por entender que este poderia ser um assunto que interessaria inicialmente, por exemplo, às próprias comunidades[1] católicas.

Na avaliação da professora acima mencionada, as comunidades católicas teriam num estudo como este, uma possibilidade de refletir sobre uma de suas práticas, que, no seu entendimento, envolve outros setores da sociedade, extrapolando, portanto, o âmbito da Igreja Católica enquanto uma expressão somente da religiosidade e da fé católicas, estendendo-se para os âmbitos sócio-político, apresentando-se, certamente, como um forte elemento da cultura religiosa local e regional. Já se sabe que pessoas – e não só católicos, dela vêm fazendo parte, tais como representantes de movimentos sociais, de grupos indígenas, etc. Por outro lado, católicos de outros municípios, destes deslocam-se para Rondonópolis, para participar da Romaria.

Nesse sentido, segundo a mesma, um estudo como este diz respeito à História Social e Cultural, podendo interessar também às ciências das religiões, que lidam com temáticas atinentes às religiosidades populares, entre outras.

Assim, sem nenhuma experiência na construção de conhecimentos na área de História, pois quando pensei sobre a escolha do tema ainda estava cursando o primeiro ano do curso, ao contar com a colaboração de minha orientadora, iniciei a pesquisa, começando pela Diocese de Rondonópolis, onde fiz os primeiros levantamentos documentais sobre a Romaria dos Mártires.

Naquela ocasião, a pessoa responsável pelo arquivo da Diocese, disse-me para desistir, porque eu não iria conseguir escrever sobre tal evento. Isto porque, segundo a mesma, ele vem acontecendo somente há doze anos, não havendo material suficiente, na sua avaliação, para se fazer um trabalho da natureza que eu estava propondo.

Isso, no começo, desanimou-me muito. Contudo, pensei melhor. Foi quando decidi ir até à Paróquia Bom Pastor, que é a minha comunidade religiosa, conversar com o padre Eriovaldo Couto Queirós. Ele me animou muito. Disse-me que há muito tempo já deveria ter-se escrito um livro sobre a Romaria dos Mártires. Falou-me ainda que na Diocese há material sim, o suficiente para uma pesquisa, e que até mesmo ele guarda consigo  algum material a respeito. Ele também me disse que nas minhas dificuldades eu poderia contar com a sua colaboração para esclarecer as dúvidas que fossem surgindo.

Assim, no dia seguinte à conversa com o Pe. Eri (como é popularmente chamado o pároco da Paróquia Bom Pastor), voltei à Diocese e procurei pela senhora responsável pelos arquivos desta Instituição. Disse a ela que eu resolvera levantar a documentação que o arquivo dispunha. Assim, comecei a fazer a minha pesquisa. Todos os dias, por um bom tempo, eu passei tardes inteiras na Diocese.

No terceiro dia da minha estada lá, recebi a visita de Dom Juventino Kestering, Bispo Diocesano de Rondonópolis, que gostou muito de saber que havia alguém interessado em escrever sobre esse tema. Ele me disse ainda, que se eu precisasse de sua ajuda, poderia contar com ela. Fiquei muito feliz, isto porque eu, que primeiro havia sentido medo de não ser possível escrever sobre a Romaria dos Mártires, agora já podia pensar não só que era possível, assim como também poderia contar com a ajuda do Pe. Eri e do Bispo D. Juventino Kestering. E ainda mais: poderia contar também com a contribuição do Pe. Giovane Pereira de Melo, que atualmente trabalha na Diocese de Rondonópolis e que teve ativa participação na organização das primeiras romarias em Rondonópolis, portanto, uma memória das mesmas, que agora poderia tornar-se história.

Assim que terminei a minha pesquisa na Diocese, fui para o Jornal A Tribuna, em busca de mais informações. Nele, de início, também enfrentei certa resistência em ser atendida. A pessoa responsável pelo arquivo pediu que eu voltasse no dia seguinte, às doze horas.

No outro dia, quando lá cheguei, a secretária chamou tal pessoa, que me disse não lembrar de ter dito para que eu voltasse. Então, procurei ser o mais simpática possível, explicando novamente o motivo da minha presença ali, especialmente da minha pesquisa – que ela é uma etapa obrigatória na minha formação e para a conclusão do meu curso. Ele acabou atendendo-me, permitindo o acesso aos jornais do arquivo. Contudo, tive outra dificuldade, que foi o manuseio dos mesmos, já que não havia um espaço adequado à consulta. Ainda assim, consegui realizá-la.

Dessa maneira, da minha própria experiência religiosa, pelo que se pode ver, retirei o tema que passou a dar contornos à pesquisa.

Por trás do motivo pessoal já citado para a investigação histórica desse tema, havia uma indagação que me instigava e que representa no presente estudo a minha problemática inicial: Que razões levaram a Igreja Católica à realização da Romaria dos Mártires e que características tal evento vem apresentando em Rondonópolis? Desejava, portanto, saber sobre sua origem, organização, finalidades, quem são os envolvidos na sua realização, por que tal evento é realizado etc. Isto, porque, quem só participa da Romaria dos Mártires como caminhante, não imagina o trabalho que há por trás, quantas pessoas estão envolvidas, que pretensões tal evento carrega etc., o que a documentação levantada e consultada me permitiu, de certa maneira, dimensionar.

Agora, considerando a oportunidade que tive em realizar uma pesquisa, penso ter sido interessante desenvolver este estudo, que tem por tema “A Romaria dos Mártires” e como objeto de estudo “A história da Romaria dos Mártires em Rondonópolis – MT. Ele abrange o período que se estende do ano de 1992, em que aconteceu a primeira delas, a 2006, ano em que foi realizada a sua 15ª edição. Portanto, o presente estudo representa uma possibilidade de ampliar o meu próprio olhar sobre a Romaria dos Mártires, apreendendo-a cientificamente, o que sei ser bastante pretensioso pelos limites que tenho, ainda assim firmemente decidida a começar a enfrentá-los.

Meu objetivo maior foi construir um conhecimento possível sobre a história da Romaria dos Mártires, em Rondonópolis – MT, no período acima assinalado, que desse conta de suas origens e como ela tem acontecido localmente, sistematizando um saber sobre tal evento que permita um maior conhecimento, compreensão e análise sobre o mesmo, a partir de referências por mim adotadas, o que implica, de antemão, dizer que outros olhares poderão ser elaborados.

Alguns são os meus objetivos específicos no estudo desenvolvido: saber sobre a origem da Romaria dos Mártires; o sentido de sua denominação – porque essa procissão tem tal nome; elaborar um breve histórico sobre os mártires que são lembrados; situar razões que levam à homenagem dos mesmos; levantar os significados da categoria mártir e seu uso à luz do evento e de suas finalidades; assinalar etapas organizativas da Romaria dos Mártires, os setores sociais nelas envolvidos e as tarefas que são realizadas; evidenciar o evento nas suas ocorrências (a cada ano que já aconteceu/trajetos feitos/paróquias que participam/visitantes/ temas/rituais que dele fazem parte/comissões organizadoras etc.); conhecer razões que levam tantas pessoas a dele participar, ouvindo algumas delas etc.

Quanto ao quadro teórico, creio poder inscrever o tema “Romaria dos Mártires” dentro de um quadro de referências que remete a dimensões de caráter sócio-cultural, o que, no meu entendimento, coloca como uma das necessidades iniciais dialogar com a Antropologia, e situá-lo também inicialmente, no campo de investigação relacionado à História Cultural e à História Social.

Na Antropologia um dos conceitos chaves que busquei para entender o meu tema foi o conceito de Cultura. A obra consultada foi “Antropologia: uma Introdução”,[2] das autoras Marina de Andrade Marconi e Zélia Maria Neves Pressotto.

De acordo com as mesmas, para os antropólogos a cultura “engloba os modos comuns e aprendidos da vida, transmitidos pelos indivíduos e grupos, em sociedade.”[3] Assim, na pesquisa bibliográfica que fiz, procurando promover um diálogo entre o meu tema e a Antropologia, deparei-me com o conceito proposto por Edward B. Tylor. Segundo ele, “cultura […] é aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, os costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade.”[4]

Já, Felix M. Keesing, este tem a cultura como “comportamento cultivado, ou seja, a totalidade da experiência adquirida e acumulada pelo homem e transmitida socialmente, ou ainda, o comportamento adquirido por aprendizado social.”[5]

Para G. M. Foster, a cultura é “a forma comum e aprendida do dia-a-dia, compartilhada pelos membros de uma sociedade, constante da totalidade dos instrumentos técnicos, instituições, atitudes, crenças, motivações e sistemas de valores conhecidos pelo grupo.”[6]

A partir desses conceitos, creio ser possível, hipoteticamente, dizer que a Romaria dos Mártires é um elemento da cultura humana, também presente na cultura local, apreendida e socialmente partilhada, que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, costumes, valores etc., que envolve diferentes setores, com finalidades às vezes semelhantes e em alguns aspectos diferentes.

Em Rondonópolis-MT, a Romaria dos Mártires emergiu por meio da Igreja Católica e vem acontecendo a 15 anos, sendo essa tradição transmitida, por exemplo, de pais para filhos, como acontece com muitos que participam desde criança de tal evento e que agora levam seus filhos, realizando assim um ciclo de transmissão/socialização desse elemento da cultura, que traz outros tantos nele embutidos.

Outro conceito que busquei na Antropologia foi o de “Religião”. Segundo as autoras consultadas, “a religião é um aspecto universal da cultura […]”[7]. Ou seja, a religião é um elemento da cultura comum a muitas pessoas. É da religião que emerge o meu tema A Romaria dos Mártires, esta que entendo como uma de suas manifestações.

A religião como um elemento da cultura, historicamente vem sendo passada de pai para filho desde a Antigüidade, quando ela era puramente doméstica e tinha o pai como chefe religioso. As casas permaneciam com o “Fogo Sagrado” aceso o tempo todo. Nelas, eram feitas também as oferendas aos mortos.

Segundo Fustel de Coulanges,

Toda essa religião se limita ao interior de cada casa. O culto não era público.[8]  Somente a partir de Jesus Cristo, começou-se a  conceber Deus como sendo […] estranho à natureza humana […] um ser único […] O culto passou a não ser mais secreto; os ritos, as orações […] nunca mais foram escondidos […][9]

Nesta perspectiva, hoje há uma grande abertura religiosa, com inúmeras formas de manifestações de fé, não só de caráter privado, mas também de caráter público. A Romaria dos Mártires, no meu entendimento, é uma entre tantas.

Do ponto de vista historiográfico, o estudo temático que proponho pode ser desenvolvido dentro dos quadros de referência da História Cultural, já que se trata de uma dimensão da cultura religiosa. Por outro lado, pode ser inscrito nos quadros de referência da História Social, pois este estudo abordará também a experiência humana num evento em que as pessoas são protagonistas.

Nas pesquisas bibliográficas que fiz, apoiei-me no livro de José de Assunção Barros,[10]  que traz reflexões por ele desenvolvidas sobre o campo da História Social e da História Cultural; no livro organizado por  Ciro Flamarion Cardoso e Ronaldo Vainfas,[11] que traz também reflexões feitas por alguns autores sobre os campos da história antes citados; em José  Luiz Santos,[12] que aborda diversas  dimensões do conceito de cultura; em Ronaldo Vainfas,[13]  que discute a presença dos sujeitos na construção da história (sujeitos comuns); em Marina de Andrade Marconi e Zélia Maria Neves Presotto já citadas, que discutem, entre outros conceitos da Antropologia, os conceitos de cultura e de religião.

Para a elaboração do contexto histórico do município de Rondonópolis, Mato Grosso, consultei alguns estudos feitos por pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário de Rondonópolis. Entre eles, estão os estudos da Drª. Maria Elsa Markus, Dr. Paulo Augusto Mário Isaac, Dr. Flávio Antônio da Silva Nascimento, Ms. Plínio José Feix e Drª. Luci Léa Lopes Martins Tesoro.

Sobre religião, consultei Castro M. Bartolomé Ruiz, Jaqueline Hermann, Fustel de Coulanges, Raimundo Arrais, Fernando Torres Londoño etc.

Consultei também Antônio Joaquim Severino[14] e Maria do Pilar de Araújo Vieira (et alii),[15]com vistas à elaboração do projeto de pesquisa.

Além das fontes bibliográficas já citadas, outras mais foram usadas, tais como as fontes escritas (a exemplo do Jornal A Tribuna, aonde fiz pesquisa em arquivos de jornais; institucionais, a exemplo dos documentos que consultei na Diocese) e outras. Também construí algumas fontes orais, através de entrevistas gravadas com participantes da Romaria dos Mártires, tais como as  realizadas com as senhoras Terezinha Maria Gonçalves, 71 anos, aposentada, moradora do Bairro Marinópolis, Rondonópolis-MT; Raulina Medeiros Guedes, 59 anos, do lar, moradora do Bairro Santa Cruz, Rondonópolis-MT; Maria Beltrame, 40 anos, do lar, moradora do Bairro Bom Pastor, Rondonópolis-MT; com os jovens Edér Bruno dos Santos, 21 anos, trabalhador em serviços gerais, morador em Pedra Preta-MT; Daiane Alves dos Santos, 16 anos, empacotadeira e estudante, moradora do Jardim Liberdade, Rondonópolis-MT; Welinton Machado Cabral, 21 anos, motorista, morador do Jardim Adriana, Rondonópolis-MT; José Carlos Sousa Costa, 19 anos, professor, morador em Juscimeira-MT; Ana Lúcia Alves de Lacerda, 20 anos, trabalhadora em serviços gerais, moradora do Jardim  Rondônia, Rondonópolis-MT; Bárbara Mascarenhas, 22 anos, secretária, moradora em Juscimeira-MT; Ivanildo José Ferreira, advogado e professor do Departamento de História/ICHS/CUR/UFMT, que vem participando da organização da Romaria dos Mártires. Fotografias (muitas feitas por mim mesma), e documentos áudio-visuais também usei para a elaboração do presente estudo.

Quanto ao desenvolvimento da minha pesquisa, orientei-me pelo seguinte cronograma: na coleta dos documentos escritos e realização de entrevistas, iniciei os trabalhos em 2003 e conclui no mês de janeiro de 2007. No que se refere ao texto monográfico para o exame de qualificação, finalizei-o em meados de fevereiro/2007. Já a versão final, foi concluída em meados de março/2007.

Penso que a minha pesquisa é importante tanto para mim quanto para a sociedade de Rondonópolis porque os Mártires lembrados pela Igreja Católica no Brasil são aqueles que deram sua vida, por exemplo, em causas atinentes aos excluídos da terra, trabalhadores do campo etc., que buscam por terras para o trabalho, para alimentar suas famílias, que lutam por justiça social, por mais dignidade às pessoas; mártires que lutaram contra a opressão; que lutaram contra diferentes formas de exploração etc., e que não devem ser esquecidos.  Como se sabe, a cada ano surgem novos conflitos no campo, entre latifundiários e excluídos da terra. É aí que também estão essas pessoas, religiosas ou não, que arriscam suas vidas, confrontando, denunciando, organizando etc. Ao buscarem amenizar esses conflitos, muitas delas são assassinadas.

Sendo assim, minha monografia também poderá servir para manter viva a memória dos religiosos e dos trabalhadores rurais (pessoas comuns fazendo História), pessoas essas que passaram a protagonizar ações, tomar iniciativa em suas lutas a favor dos injustiçados, e que acima de tudo animam pessoas, muitas vezes milhares delas, a lutarem por seus direitos. Em relação à Academia, penso que meu estudo é importante porque aborda um tema que está relacionado à História Cultural e à História Social, trazendo um tema vinculado à religiosidade popular para uma apreensão científica.

Esta Monografia está assim organizada.

Já na Introdução eu apresento o tema – “Romaria dos Mártires”; o objeto de estudo – “Uma história da Romaria dos Mártires em Rondonópolis-MT, no período de 1992 a 2006”, portanto, delimitando-os espaço-temporalmente, assinalando alguns conceitos utilizados no ponto de partida, contando parte da história da pesquisa que fiz.

Na Unidade I, esboço, por meio de estudos consultados, um breve histórico de Rondonópolis-MT, por ser no contexto desse município que localizo o objeto de estudo.

A Unidade II trata sobre religião: transformações ocorridas desde as primeiras formas de manifestação, especialmente rompendo o espaço privado, valendo-se do espaço público a partir daí, citando, nesse sentido, as procissões e as romarias como uma de suas modalidades.

Quanto à Unidade III, nela assinalo a origem e finalidades da Romaria dos Mártires, e alguns dos seus sentidos.

Na Unidade IV, descrevo a organização da Romaria dos Mártires em Rondonópolis – MT, e alguns aspectos que a constituem, apreciando em especial, os cantos.

A Unidade V é um registro das romarias que adotaram lemas da Campanha da Fraternidade e algumas reflexões que oportunizaram.

Na Unidade VI situo a trajetória urbana das romarias.

Quanto a Unidade VII, nela evidencio alguns aspectos biográficos de mártires que têm sido lembrados e homenageados nas romarias.

 


 

UNIDADE I

 

RONDONÓPOLIS-MT: ELEMENTOS DE SUA HISTÓRIA

 

Para a elaboração deste breve histórico sobre o município de Rondonópolis, Estado de Mato Grosso, busquei referências em estudos realizados por professores pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário de Rondonópolis. Entre eles, estão os estudos da Drª. Maria Elsa Markus, Dr. Paulo Augusto Mário Isaac, Dr. Flávio Antônio da Silva Nascimento, Ms. Plínio José Feix e Drª Luci Léa Lopes Martins Tesoro.

Rondonópolis é um município que está situado na região Sudeste de Mato Grosso. Tem uma extensão territorial de 4.165 km2, e atualmente possui uma população aproximada de cento e oitenta mil habitantes.

 

Figura 1: Mapa Urbano de Rondonópolis

Fonte: Prefeitura Municipal de Rondonópolis.

 

Segundo estudos realizados no Sítio Arqueológico Ferraz Egreja, os primeiros sinais de vida em terras que hoje pertencem ao município de Rondonópolis datam de pelo menos cinco mil anos atrás.

Quanto à ocupação mais recente, de acordo com Luci Léa Lopes Martins Tesoro, no ano de mil novecentos e quinze, Joaquim da Costa Marques, então Presidente da Província de Mato Grosso, promulgou o Decreto Lei nº. 395, que estabelecia uma reserva de 2.000 hectares para o patrimônio da povoação do Rio Vermelho.

O povoado Rio Vermelho foi elevado a distrito em dez de agosto de mil novecentos e quinze, ocorrendo a sua emancipação política em dez de dezembro, de mil novecentos e cinqüenta e três, que foi regulamentada pela Lei Municipal 2.777, de 22 de outubro de 1997[16].

À época, o lugar era povoado por índios Bororo, quando passou a ocupá-lo também um destacamento militar na localidade de Ponte de Pedra, assim como passou a ser procurado por pessoas que vinham para a região em busca de riquezas, terra e trabalho. 

Rondonópolis é considerada hoje o terceiro maior município de Mato Grosso. É tido como o município mais desenvolvido economicamente. Contudo, alguns dos estudos consultados dão conta que uma vasta extensão de terra está nas mãos de grandes latifundiários, enquanto a maioria da população é esquecida, inclusive pelo poder público, que deveria, pelo menos, prestar-lhe maior e melhor assistência. Por outro lado, são inúmeras também as problemáticas urbanas: nem todos têm acesso à água tratada, à moradia, à educação, à saúde, ao transporte etc.

É nesse contexto que as diferenças entre as classes que o compõem vão tornando-se visíveis, o que no município tem engendrado as lutas de classes, colocando em lados opostos interesses antagônicos, dando visibilidade a lutas sociais e políticas, que têm envolvido trabalhadores rurais e urbanos, levando-os a se juntarem em certos momentos para lutar por direitos, tais como o direito de acesso à terra, pelo direito ao trabalho, à saúde, ao seu bem-estar e da sua família, a melhores salários etc.

Como teria sido a passado dessa região? Em que medida ele pode contribuir para que entendamos esse presente de tensões?

Segundo pesquisa realizada por Paulo Augusto Mário Isaac[17], quando os primeiros colonizadores chegaram à região Sudeste de Mato Grosso, no Século XVII, encontraram aqui os “aborígines”, aos quais deram várias denominações, tais como Porrudos, Coxiponeses, Cabaçais, Coroados, Orarimugadoge e a denominação de Bororo.

Entretanto, sobre a origem do povo Bororo não se tem nada comprovado. Alguns pesquisadores supõem que eles tenham vindo do Rio Negro, passando pela Bolívia, devido a sua linguagem e aos seus adornos, que são iguais aos que são usados na região citada.

Em resultado obtido por pesquisas arqueológicas realizadas em mil novecentos e oitenta e três, na Área Indígena Tadarimana, ocupada pelo povo Bororo, Irmhild Wüst diz que

Dentro da reserva indígena e num raio de aproximadamente de 50 km, foram levantados até agora 29 sítios arqueológicos, 23 dos quais, sítios cerâmicos a céu aberto, 5 abrigos sob rocha e um sítio de arte rupestre a céu aberto[18].

Para Paulo Serpa[19],

O processo de contato dos Bororos com a sociedade se desenvolve há três séculos e pode ser analisado em três etapas distintas. A primeira etapa inicia-se em meados do século XVIII com a descoberta do ouro na região de Cuiabá […] Essa etapa […] os bandeirantes […] promoveram várias expedições punitivas contra os Bororos […]. A segunda etapa desse processo se resume de contato de resume na ‘pacificação’ dos bororos […] Enfim, no século XIX são encerradas as expedições punitivas […] iniciou-se então, o processo de ‘civilização’ com a fundação das Colônias Militares, em mil e oitocentos e oitenta e sete, as colônias de Tereza Cristina e Isabel, ambas no Médio São Lourenço, em mil novecentos e em mil novecentos e dois as Colônias Salesianas, na área dos rios das Garças, das Mortes e Sangradouro. Em mil e novecentos e dez, a criação do S.P.I., consolidou-se o processo de ‘pacificação’ com o estabelecimento de áreas reservadas aos Bororos e a conseqüência ocupação do território tradicional pelas frentes de mineração e agropecuária. A terceira etapa se caracteriza pelo contato permanente com os elementos representantes das frentes de expansão. Essa é a etapa mais dolorosa do processo histórico do contato, quando os Bororos […] perderam seus territórios de exploração, sofreram uma depopulação inusitada e passaram a depender exclusivamente dos agentes da política indigenista oficial, por um lado pelo S.P.I. e posteriormente pela FUNAI  e, por outro lado, pelos missionários salesianos. O resultado do processo de contato dos Bororo com os segmentos da sociedade nacional caracteriza-se pelo esbulho da maior parte do seu território tradicional e pela drástica redução de sua população.

No século XVIII, os Bororo ocupavam uma área de aproximadamente trezentos e cinqüenta mil quilômetros quadrados. No entanto, hoje seu território está reduzido a cinco áreas indígenas, num total de cento e quarenta e um mil e seiscentos e oitenta e um alqueires, situados em oito municípios do Estado de Mato Grosso.

Mas, a história do contato permanente dos “aborígines” da região de Rondonópolis com a população das frentes de expansão, teve início, de acordo com estudos consultados, em mil novecentos e dois, com a chegada de um grupo de pessoas vindas do estado de Goiás, grupo este que se instalou às margens do rio Vermelho, em um lugar denominado pelos migrantes, de “Vilarejo Rio Vermelho”, hoje Rondonópolis.

Em nível local, é bastante perceptível decorrências da ocupação branca no que se refere às populações indígenas aí presentes. Tomemos aqui como exemplo a Aldeia Indígena de Tadarimana, localizada no município de Rondonópolis, na bacia do rio Vermelho, às margens esquerda deste e do Rio Tadarimana, e à margem direita do Rio Jurigue. Com uma área de aproximadamente nove mil e setecentos e oitenta hectares, nela hoje vivem apenas duzentos e dois índios Bororo.

Se em toda sociedade há contradições, com os Bororo não é diferente. Atualmente, eles conseguiram um pouco de terra (não o suficiente). No entanto, segundo Paulo Augusto Mário Isaac, além dos riscos, do descaso das autoridades e de setores da população rondonopolitana, a área indígena citada, bem como a população ali residente, corre sérios riscos por práticas efetuadas por alguns índios dessa comunidade. Nela, foram constatados arrendamentos de terra para pequenos agricultores residentes na região de Rondonópolis, e também retiradas indiscriminadas de madeira e de bambu, problemas que, segundo o acima mencionado pesquisador, já em mil novecentos e noventa e cinco a FUNAI, órgão responsável pelo bem-estar dos índios, tinha conhecimento, sem ter, contudo, tomado as devidas providências para solucioná-los, “por fazer parte da política de funcionários do órgão encobrir ‘algumas irregularidades’ em troca de apoio político no órgão indigenista”[20].

 Percebe-se, portanto, neste contexto, interesses de cunho particular imbricados em um órgão que deveria zelar pelo interesse e bem-estar dos índios da referida região. Lembrando em tempo que a comunidade indígena não se beneficiava com isso, pois a renda era apropriada apenas por alguns indivíduos.

Apesar do longo tempo que se passou da dita “pacificação” dos Bororo, estes ainda vivem no seu dia-a-dia a discriminação e a violência sofrida no passado, tanto física quanto moral, sendo tratados como seres diferentes dos outros  seres humanos.

Podemos observar isso, quando índios Bororo vêm à cidade e ficam na Praça dos Carreiros (região central da cidade de Rondonópolis). A maioria das pessoas que por ali passa os olha com descaso, como que dizendo: “que degradante!”; “esse problema não é meu!”, esquecendo-se (muitas vezes, até desconhecendo), os reais motivos que levam os índios a viverem dessa maneira.

Há ainda mais um agravante, que é a expropriação de suas terras, a qual eles tentam resistir bravamente, enfrentando a ganância do mundo e dos interesses capitalistas.

Flávio Antônio da Silva Nascimento[21] avalia que as origens do povoamento branco na região não estão completamente esclarecidas. Provavelmente, tenha ocorrido por volta de mil oitocentos e setenta e cinco, com a implantação de um destacamento militar. Mas há divergências entre os estudiosos de período sobre essa data, principalmente pela grande lacuna existente.

No tocante à ocupação branca, na avaliação de Plínio José Feix[22],

O processo de ocupação da microrregião foi protagonizado, inicialmente, por três categorias de trabalhadores: os garimpeiros, que desenvolveram as atividades de extração do diamante, principalmente nos municípios de Poxoréu, Guiratinga e Itiquira; os pecuaristas, que desbravaram principalmente os cerrados para a criação de gado de corte; e os agricultores, que se fixaram em áreas de ‘terra de cultura’ para desenvolverem a agricultura familiar.

Para Carmem Lúcia Senra Itaborahi de Moura, “as primeiras famílias de agricultores se fixaram na atual cidade de Rondonópolis em 1902, que na época era distrito do município de Poxoréu, do qual se emancipou em 1953”[23].

Até a década de hum mil novecentos e quarenta, a migração de trabalhadores rurais vindos de outros estados foi um processo lento e espontâneo, pelo que consta em alguns estudos pesquisados. De acordo com estes, os migrantes vinham em busca do sonho de ficarem ricos, devido às descobertas de minas de ouro e pedras preciosas. Também na esperança de obterem um pedaço de terra, a fim de desenvolverem ali uma agricultura familiar. Em geral, eles eram pessoas pobres e viam nessa possibilidade de acesso à terra a chance de melhora de vida para si e suas famílias. Elas vinham também em busca de trabalho.

Na apreciação feita por Flávio Antônio da Silva Nascimento, percebe-se que ocorreram importantes transformações na região, na década de hum mil novecentos e quarenta, tais como melhoria nas estradas, estas que beneficiaram as comunicações e o fluxo de migração. Daí teve início o processo de colonizações públicas, por meio das quais os trabalhadores se estabeleceram na terra por meio de sua posse; e o processo de colonização privada, que era feito por empreendimentos particulares, o que se dava através da venda de pequenos lotes.

Esse processo de migração teria se dado por meio de várias frentes de expansão. A primeira, que vai de hum mil oitocentos e setenta e cinco a hum mil novecentos e quarenta, é denominada de Fase Pioneira, que foi marcada pela persistência dos “pioneiros”. Isso porque além de chegarem a um lugar “esmo”, encontraram nesta região a resistência indígena, apesar de os pioneiros, com sua força (arma de fogo), terem conseguido “liquidar” essa resistência, pelo menos o suficiente para fazê-los permanecer. Assim, eles conseguiram edificar neste local, um vilarejo, no intuito da realização dos seus próprios propósitos, dos quais a população indígena parece não ter feito parte.

É claro que eles não tiveram todos os seus sonhos realizados. No entanto, os migrantes que vieram para esta região na década de quarenta, puderam realizar e implantar muitos deles. Isto é, na década de um mil novecentos e quarenta, homens e mulheres, anônimos migrantes, possibilitaram o crescimento populacional (o que elevou Rondonópolis nos anos de hum mil novecentos e noventa à terceira cidade mais populosa do Estado de Mato Grosso); também, deram início ao crescimento econômico da região. Por exemplo: eles buscavam por terras de cultivo e para a criação de gado, e Rondonópolis correspondia a essa expectativa devido ao seu ecossistema.

Esse desenvolvimento teria ocorrido também, graças à atuação da Comissão Rondon, que tinha à sua frente o Marechal Cândido Rondon.

Além da instalação da linha telegráfica pela mesma, ela também contribuiu com a construção de uma estrada que ligava Goiás com Cuiabá. Daí, em hum mil novecentos e dezesseis, o povoado Rio Vermelho ter tido a sua primeira casa do comércio; em hum mil novecentos e vinte e dois, já com sua elevação a distrito e a mudança de seu nome (que de povoado Rio Vermelho passou a se chamar Rondonópolis em homenagem a Marechal Cândido Rondon), foi instalado aqui um ponto telegráfico, ocorrendo no ano de hum mil novecentos e vinte e quatro a primeira transmissão.

 O primeiro diretor dessa estação teria sido Benjamim Rondon, filho do Marechal Cândido Rondon. Ele também foi responsável pela construção da primeira balsa, que era utilizada para fazer a travessia do Rio Vermelho, já que na época não havia uma ponte sobre o mesmo.

Em hum mil novecentos e quarenta e dois houve a construção de uma ponte sobre o Rio Vermelho, que logo foi levada pela enchente.

Apesar da melhora que a abertura de estrada trouxe para o povoado, este, contudo, passou por adversidades no final dos anos vinte e começo da década de trinta, tais como a estada dos “revolucionários” da Colona Prestes, que de acordo com registros consultados e com avaliações neles contidas, “saqueavam” em busca de alimentação; doenças como o “fogo selvagem”, que causou muitas mortes; enchentes; diminuição das atividades garimpeiras nas áreas próximas etc., causando o desaceleramento do crescimento populacional, na avaliação de alguns. Segundo Flávio Antônio Nascimento, em hum mil novecentos e vinte e cinco, o povoado tinha vinte e cinco pessoas, tendo ocorrido, portanto, um certo “esvaziamento” do lugar.

Contudo, no final dos anos de hum mil novecentos e quarenta foram implantadas nesta microrregião várias colônias agrícolas. Daí até hum mil novecentos e sessenta, houve um intenso movimento migratório para a mesma. Grandes proprietários de terra vieram de outros estados em busca de terra barata. Além desses, vieram outros migrantes. A maior parte deles era de trabalhadores rurais pobres, vindos do interior do Nordeste, do Sudeste, do Sul, que vinham, na visão de alguns pesquisadores, em busca de terra, mas o que a maioria deles conseguiu foi tornar-se apenas mão-de-obra barata.

Esse período teria sido a fase do capitalismo mercantil, que, segundo Plínio José Feix, “extraía parcela da renda dos trabalhadores rurais através de transações comerciais e que exigia deles, assim, um sobretrabalho para garantir sua sobrevivência” [24].

Na realidade, essa era a principal forma de subordinação e de exploração dos pequenos produtores e trabalhadores rurais, solidificando cada vez mais a apropriação, pelos capitalistas, das terras aqui existentes. Ou seja, os capitalistas recebiam terras doadas pelo governo ou compradas por preços irrisórios, tornando-se grandes latifundiários na região.

Houve aí, portanto, uma intensificação da migração; da apropriação privada de terras e do desenvolvimento econômico e social da região. Esse movimento ficou conhecido como a Fase de Fronteira Agrícola.

É claro que a ação do Estado foi de fundamental importância para a ocupação e desenvolvimento socioeconômico da microrregião aqui tratada, pois já com a “Marcha para o Oeste” o governo doava terras, principalmente para a iniciativa privada.

Neste contexto, na avaliação de alguns estudiosos, o que teria favorecido o crescimento da economia foi a construção de estradas, pois Rondonópolis estava situada em uma posição geográfica privilegiada. Assim, tornou-se entroncamento de duas rodovias - uma ligando Cuiabá – Rondonópolis – Campo Grande (atual BR 163), e outra ligando Cuiabá – Rondonópolis – Goiás (atual BR 364).

Já, o período entre hum mil novecentos e sessenta e hum mil novecentos e oitenta, conhecido como Frente de Integração Econômica, teve como principal característica o processo de expansão do capitalismo na agricultura, com grande concentração de terras nas mãos de empresários, o que gerou maior aceleração na ocupação do território e que trouxe consigo a chamada “modernização”, que acabou por “revolucionar” a agricultura e a pecuária, que contaram com incentivos governamentais, por intermédio de programas, tais como: POLOCENTRO, SUDAM, PRODOEST, PROTERRA.

O maior impulso para o desenvolvimento foi o cultivo da soja, iniciado na década de setenta, tornando-se o principal produto de exportação. Isso se deve principalmente à inovação tecnológica na produção, o que fez com que a região desenvolvesse relações comerciais nesse setor com outros setores da economia, relações essas em nível local, regional e internacional.

Rondonópolis se tornou um dos municípios de grandes plantações de soja, do Estado de Mato Grosso, o que pode ser constatado em épocas de plantio, pois até em regiões como a que liga Guiratinga a Barra do Garças, onde até pouco tempo atrás se via apenas plantações de arroz e feijão, hoje, praticamente só se vê o verde da soja.

A inovação tecnológica na produção fez com que a partir daí ocorresse a supervalorização da terra. Com isso, os posseiros acabaram por ser expulsos da mesma, o que levou muitos desses trabalhadores rurais para a cidade de Rondonópolis, agravando ainda mais os problemas sociais já existentes.

Nessa época, até mesmo pela abundância de mão-de-obra, chegou a ser praticada a escravidão por dívidas, prática realizada em muitas grandes fazendas. Aliás, ainda hoje não é incomum a constatação desse tipo de escravidão no estado de Mato Grosso.

É nesse processo de desenvolvimento do capitalismo que se agravaram ainda mais as contradições geradas por este sistema em Rondonópolis, como avalia Maria Elsa Markus, ao dizer que, nesse contexto,

ganha importância […] a questão urbana, por conta do seu agravamento em  Rondonópolis, no mesmo período, principalmente com o aumento  populacional, que não vem sendo acompanhado, na mesma medida, de garantias necessárias à inclusão social […] o desemprego, o subemprego, a falta de moradia, de saneamento básico, de acesso à escola […] a saúde pública está longe de assegurar as condições mais elementares àqueles que demandam os seus serviços; há um aumento assustador da  criminalidade, do tráfico de drogas, da prostituição; o salário é humilhante […] sem esquecer a acintosa existência de nichos de prosperidade e riqueza que, não se há de ter dúvida, contemplam uma minoria de pessoas, através do aviltamento da minoria.[25]

Muitos desses aspectos acima situados para serem constatados basta ir até a região central de Rondonópolis, onde durante o dia há um crescimento cada vez maior de pessoas mendigando; à  noite é possível ver jovens se prostituindo e fazendo uso de drogas. Isso se deve principalmente à má distribuição de renda, ou seja, um grande acúmulo de riqueza nas mãos de poucos, enquanto a maioria perece, como se não fizesse parte dessa sociedade.

Para Plínio Feix, “a questão agrária e a questão urbana são as duas questões sociais mais explosivas na microrregião de Rondonópolis”.[26]

Com pouco mais de 50 anos de emancipação político-administrativa, com uma população aproximada de 180 mil habitantes, Rondonópolis se tornou conhecida como a “Capital Nacional do Agronegócio”.

 No entanto, o modelo de desenvolvimento praticado na região tem trazido benefícios para os empresários capitalistas e acentuado cada vez mais a exclusão social, pois enquanto o agronegócio tem estado em franca expansão nesses últimos anos, na periferia da cidade surgem, a cada dia, bairros carentes, sem nenhuma infra-estrutura.

É nesse contexto de profundas desigualdades que nesses últimos anos vem ocorrendo a Romaria dos Mártires, tema do presente estudo.


UNIDADE II

 

RELIGIÃO: DOS CULTOS PRIVADOS ÀS ROMARIAS

 

Na Antiguidade, a religião era puramente doméstica, ou seja, cada família tinha seu próprio deus e esse deus só poderia ser adorado por essa família. Cada casa tinha um lugar reservado para o fogo, que por ser considerado sagrado, era mantido sempre aceso. A religião, por ser doméstica, “se limitava ao interior da casa. O culto não era público,”[27] e assim cada família tinha suas regras e seus rituais diferenciados das demais famílias.

Neste contexto, a religião era passada de pai para filho (sexo masculino), que transmitia junto a sua crença, que herdou, por sua vez, de seus antepassados. Nesse conjunto de crenças estavam os ritos, o culto aos mortos, que para a família eram tidos como deuses protetores; o culto ao Fogo Sagrado, que segundo Fustel de Coulanges, “O fogo do lar era, pois, a providência da família […] ofereciam-lhe sacrifícios […] [que] resumiam em alimentar e avivar o fogo sagrado […]”[28] Assim, a religião era o principal elo de união entre a família. No entanto, como citado acima, só participava e era herdeiro na transmissão da religião o filho do sexo masculino.

Com o passar do tempo, algumas famílias se uniram, formando grupos, e com isso conceberam uma divindade superior a seus deuses domésticos. Para Fustel de Coulanges, a união desses grupos familiares diversos deu origem às tribos. A partir daí, cada tribo passou a ter um altar, onde reverenciavam sua divindade protetora.

Com os novos modos de agir e pensar humanos, surgiu a crença nos deuses de natureza física, tais como Zeus, Hera, Atenas, etc.

Assim, a religião foi crescendo e se expandindo. Com isso, a sociedade foi fortalecendo-se ainda mais, pois para essas pessoas a cidade não era mais que uma associação religiosa das famílias, ou seja, era a religião que ditava todas as regras que deveriam ser seguidas. Então, cada cidade tinha seus deuses que só a ela pertenciam e protegiam, e os homens só a esses deuses conheciam. Ao homem não cabia escolher sua crença. Se ele morava em determinada cidade, ele deveria acreditar e submeter-se às regras, participar dos banquetes da religião dessa cidade. Os que não seguiam os mandamentos dessa religião eram penosamente castigados.

De acordo com Fustel de Coulanges, “A religião era um conjunto […] de pequenas crenças, de pequenas práticas e de muitos minuciosos ritos”.[29]. Além disso, a religião estava presente em tudo que os cidadãos faziam, isto é, se duas cidades entrassem em guerra, não era apenas os soldados que lutavam entre si; os deuses das duas cidades também faziam parte dessa luta.

Contudo, com as transformações ocorridas ao longo do tempo na sociedade, a religião perdeu o caráter de hereditariedade. Foi criada uma nova religião, ascenderam lares domésticos, altares de encruzilhadas, lares de tribos, passaram a acreditar que o culto era para todos, sem distinção de classe. Na verdade, tudo começara realmente a mudar, pois a religião que fora durante longos séculos a única orientação de governo, a partir dali o interesse público começou a substituí-la, ou seja, o governo passou a atender as necessidades dos cidadãos não mais baseando suas decisões no que mandava a religião. A partir daí, podemos dizer que a religião deixou de governar. Neste contexto, a religião primitiva sofreu mudanças definitivas no tempo e envelheceu. Já, o ser humano, este amadureceu espiritualmente e concebeu novas crenças. Como já foi dito anteriormente, existiam muitos deuses, tanto de natureza física quanto natural. Com as mudanças ocorridas na mentalidade humana, o homem sentiu a necessidade de diminuir o seu número.

Mas, o marco maior dessa transformação, foi surgimento do cristianismo. Na avaliação de Fustel de Coulanges,

Com o cristianismo, não só o sentimento religioso se reavivou, mas dirigiu-se a metas mais elevadas e menos materiais […] começou-se a conceber Deus como sendo, na sua essência, realmente estranho à natureza humana e ao mundo material […] Deus apresenta-se agora como um ser único, infinito, universal, único gerador e esteio vital para os mundos, preenchendo sozinho a necessidade de adoração inata no homem.[30]

A partir daí, com essa nova religião (Igreja Católica Apostólica Romana), a mulher, os estrangeiros, os escravos, isto é, todos os seres humanos, sem distinção, passaram a ser livres para render cultos perante Deus. Perante o cristianismo todos passaram a ser iguais; os rituais praticados não eram mais secretos. A vida do ser humano sofreu transformações irreversíveis. Se na religião antiga o pai tinha direito e poder de vida e morte sobre a família, agora o pai perdeu essa autoridade absoluta, passando os filhos e a esposa a serem tratados como seu igual.

Outro ponto de grande importância para os cristãos é o da centralidade da figura de Jesus Cristo. Os cristãos reconhecem a importância dos ensinamentos morais de Jesus, entre os quais salientam o amor a Deus e o amor ao próximo, e consideram a sua vida como um exemplo a seguir. Acreditam que ele é o Filho de Deus que veio à Terra libertar os seres humanos do pecado através da sua morte na cruz e da sua ressurreição, embora variem entre si o entendimento quanto ao significado desta salvação e como ela se dará. Para a maioria dos cristãos, Jesus é completamente divino e completamente humano.

Com o cristianismo representado pela Igreja Católica Apostólica Romana, constituiu-se na sociedade humana a Instituição entendida por muitos como a mais poderosa do mundo, tendo sua sede em Roma, com o Papa sendo seu representante maior.

Aqui no Brasil, o catolicismo foi introduzido com os europeus, na época da colonização portuguesa, através dos missionários jesuítas. Estes, para cá vieram em hum mil e quinhentos e quarenta e nove. Neste contexto, é claro que o catolicismo aqui introduzido estava organizado de acordo com as regras da Coroa Portuguesa, e o papel dos jesuítas era converter toda população, tanto urbana quanto rural, e até mesmo os “aborígines”.

Mas, segundo Jaqueline Hermann,

apesar do esforço da Companhia de Jesus e de seu inquestionável papel de disseminação do catolicismo em terras brasileiras, a organização da instituição eclesiástica deu-se de forma extremamente lenta no Brasil […] a colônia brasileira teria seu primeiro bispado, muito tempo o único, criado na Bahia em mil e quinhentos e cinqüenta e um.[31]

Junto com o catolicismo veio também a devoção aos santos, tais como Nossa Senhora, São Judas, Santa Edwiges, Santo Expedito e outros. Depois, foram surgindo os santos brasileiros ou pessoas consideradas como tais, como Nossa Senhora Aparecida, padre Cícero, frei Damião e outros.

Lembremo-nos que na Idade Média o culto aos santos era uma prática constante. A Reforma Protestante atacou firmemente o culto a imagens, mas o Concílio de Trento reafirmou e legitimou a veneração aos santos, pois esses eram considerados os intercessores dos homens perante Deus. Conseqüentemente, cresceu cada vez mais as devoções aos santos e surgiram também várias devoções à Maria, como por exemplo, Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora Desatadora dos Noz, Nossa Senhora Aparecida (que se tornou a padroeira do país, inclusive com uma igreja erguida para ela, aonde os devotos de todo o Brasil vão para pagar suas promessas e deixar ali objetos representando a graça alcançada).

Esse tipo de devoção acontecia (acontece), tanto em pequenas localidades quanto nos grandes centros urbanos. E, com a vinda dos serviços gráficos e da imprensa para o Brasil, intensificou-se mais ainda essa adoração aos santos, pois surgiram os santinhos impressos em papel, junto com oração de pedido, os quais até hoje podemos observar nas portas das igrejas, nas procissões e nas romarias - sempre têm pessoas distribuindo esse tipo de material em retribuição a alguma graça alcançada (é claro que com menos intensidade que a alguns anos atrás), pois essa prática teve sua efervescência até os anos de hum mil novecentos e sessenta - setenta, depois declinou.

Para esse declínio, na avaliação de Fernando Torres Londoño,

Vários processos podem ser apontados como responsáveis […] a secularização do cotidiano celebrada pelos meios de comunicações; o crescimento de novas igrejas e a evidência de outras religiões; as mudanças pastorais provocadas com a implantação do Vaticano II […][32]

Esse declínio também pode ser atribuído a novos modos de vida, em que um bom número de pessoas deixou a crença religiosa relegada a segundo plano.

No tocante às procissões, em sua pesquisa sobre o catolicismo no século XIX, Raimundo Arrais diz que

o trajeto da procissão revestia o espaço, no momento do cortejo, de um sentido sagrado. Deslocando-se pelo espaço aberto, o cortejo, que seguia o pálio com a imagem sagrada e outras imagens secundárias […][33]

Nas procissões, portanto, sempre estava em evidência a presença das imagens, representando a possibilidade de intercessão pela intervenção divina.

Segundo Raimundo Arrais,

gerido pela instituição jurídica do padroado o catolicismo brasileiro que se desenvolveu no Brasil desde a colonização adquiriu um forte caráter leigo. Era um catolicismo em grande medida movimentado em torno das confrarias, irmandades e ordens terceiras e externado por meio delas.[34]

Nessa época, a edificação de um templo era bem demorada e tinha um custo financeiro bem elevado. Ela era feita por meio de doações dos fiéis, que davam desde terrenos até móveis preciosos, livros raros, etc. A sua construção era tão demorada que, às vezes, o templo era aberto ao público com as obras incompletas. Essa demora também era devido a proporções, opulência e beleza arquitetônica. Todo esse trabalho era orientado pelas irmandades.

Entre muitos eventos proporcionados pela irmandade, as procissões era um deles. Nesse tipo de evento era possível observar bem a distinção social e o prestígio da alta sociedade existente no Brasil, pois as pessoas ficavam divididas, isto é, as classes sociais não se misturavam. Havia ali lugares pré-determinados conforme a divisão social.

O percurso das procissões era determinado pela localização dos templos, pois em frente a eles haveriam paradas. Isso pode ser observado ainda hoje nas procissões e nas romarias realizadas pela Igreja Católica, cujo trajeto é definido de modo a passar, preferencialmente, em ruas onde ficam localizadas as paróquias. Segundo o autor anteriormente citado, essas procissões realizadas em meados do século XIX, além do caráter religioso, serviam também para os senhores e senhoras se mostrarem em público com toda pompa, onde as mulheres da alta sociedade apareciam todas muito bem ornamentadas, com suas roupas e jóias caras, exibindo suas mucamas muito bem arrumadas.

Dentre as procissões, o autor cita as que aconteciam durante a Quaresma, onde tudo era silêncio, até os veículos eram proibidos de trafegar: eram as procissões do Senhor dos Passos; dos Fogaréus; de Cinzas etc.

Ao longo de todo século XIX aconteceram também muitas procissões, com intuito de pedir a contenção de calamidades da natureza ou em agradecimento a algo alcançado pela comunidade (inclusive vindo para os dias mais atuais, lembro que onde morei, em Guiratinga, no estado de Mato Grosso, ocorria esse tipo de procissão, como por exemplo, em época que a seca castigava a região. Nela, os moradores se uniam e saiam em procissão, uns com pedra na cabeça e outros carregando vasilhas com água. Eles saiam da cidade rezando, cantando e clamando a Deus por chuva. Iam até o Cruzeiro que existia na rodovia que liga a cidade de Guiratinga ao distrito de Tesouro - ambas no estado de Mato Grosso – inclusive, esse Cruzeiro fica bem distante da cidade. Chegando lá, rezavam e cantavam, depositando as pedras e a água aos pés da Cruz. Eu era adolescente nessa época e participei de várias dessas procissões).

Na avaliação de Raimundo Arrais, no percurso simbólico realizado pelas procissões,

atuava o espírito competitivo da população. No interior das freguesias, lavravam atritos entre as irmandades, por interesses e sentimentos partidários de padres, vigários, membros das irmandades ou simplesmente o orgulho localista dos moradores […] Neste contexto, a procissão reforçava a sobreposição das demarcações eclesiásticas, políticas, administrativas e policiais […][35]

Penso que atualmente esse espírito competitivo não se configura, necessariamente, em eventos semelhantes, o que pode ser investigado caso seja de interesse de algum pesquisador. Para os limites do meu estudo, situei as procissões como um dos rituais da Igreja Católica, por considerar a Romaria dos Mártires uma de suas formas de expressão na contemporaneidade. E é a ela que passo a dedicar maior atenção doravante.


UNIDADE III

 

ROMARIA DOS MÁRTIRES: ORIGENS E ALGUNS SIGNIFICADOS

 

“Mártir é aquele que dá um sinal extremo de sua fé em Deus e testemunho de amor aos seus irmãos até o sacrifício extremo, sendo o testemunho o que permanece fiel até o fim”.

(Pe. Giovane Pereira de Melo)

 

Na América Latina, desde o início de sua dita “colonização” (processo que ainda hoje é avaliado como em andamento), o martírio se tornou um grito tanto pela vida quanto pela fé. Devido a isso, a Igreja Católica tem buscado manter sempre viva a memória de mártires que deram suas vidas na tentativa de mudar a realidade das pessoas menos favorecidas da sociedade.

É neste contexto que passou a ser realizada, a partir de hum mil novecentos e noventa e dois, em Rondonópolis-MT, a Romaria dos Mártires, que vem constituindo-se como mais uma forma de manifestação pública da fé religiosa. Mas não só, como poderemos ver mais adiante.

As romarias estão construídas simbolicamente dentro do sistema de significações do imaginário tradicional da religiosidade popular, compartilhando, no meu entendimento, das mesmas significações da procissão.

Em Rondonópolis – MT, ela acrescenta o fato social de congregar pessoas de diversos grupos sociais, inclusive de lugares diferentes e até mesmo distantes, reunindo pessoas de toda a micro-região,[36] e não necessariamente só católicos.

 

Figura 2: Micro Região de Rondonópolis

Fonte: Prefeitura Municipal de Rondonópolis

 

Castro M. Bartolomé Ruiz define a romaria como “um espaço social de encontro de diversos grupos, e por isso é um espaço de transmissão e partilha de imaginários, símbolos e significados”[37].

Com o passar do tempo, tal como na religião, nas romarias também foram acontecendo transformações. Assim, “Foram organizadas romarias novas para símbolos novos: Romaria de Canudos, Romaria de Zumbi, Romaria da cana, Romaria da terra, Romaria do trabalho etc.”[38] Acrescente-se a essas,  a Romaria dos Mártires, que é uma homenagens aos religiosos e leigos assassinados por seu engajamento em lutas sociais e políticas  em prol dos menos favorecidos, isto é, em causa dos oprimidos e dos excluídos.

Os Mártires lembrados pela Igreja Católica no Brasil e, em especial, pela Diocese de Rondonópolis-MT, quando da realização da Romaria dos Mártires, são aqueles que deram sua vida pelas causas dos acima mencionados, como, portanto, ocorre noutros lugares do país.

Como sabemos, a cada ano surgem novos conflitos no campo, entre os latifundiários e os excluídos da terra. E é nesses processos, por exemplo, que ganham visibilidade essas pessoas - os mártires, religiosos ou não, que arriscam suas vidas, confrontando, denunciando, organizando etc., e assim buscando sanar ou ao menos amenizar esses conflitos.

Muitas dessas pessoas são perseguidas, torturadas, assassinadas, uma maneira não só de conter a luta, mas de desaconselhar a tantos outros que possam querer dela fazer parte.

Em vista disso, minha Monografia servirá também para manter viva a memória desses lutadores, pessoas essas que protagonizam ações, tomam iniciativa em lutas a favor dos injustiçados.

O Professor Ivanildo José Ferreira em entrevista que me concedeu, contou-me que no ano de hum mil novecentos e noventa e dois, quando se deu a primeira Romaria dos Mártires em Rondonópolis, haviam muitas questões envolvendo trabalhadores em luta pela posse e permanência na terra, assim como questões indígenas latentes, como a busca de garantia de seus territórios, de dignidade às suas sobrevivências etc.

Nesse sentido, percebe-se que os temas que têm norteado ao longo dos anos a ocorrência da Romaria dos Mártires, vêm sempre buscando dar um enfoque maior às questões que procuram fortalecer as lutas sociais e políticas.

Segundo o Professor Ivanildo

Só para se ter uma idéia, aqui, o primeiro grande assentamento na zona rural tinha sido a Gleba Rio Vermelho. Logo depois a Cascata, Várzea do Ouro, enfim. Mas, assim, de movimento grande foi a Gleba Rio Vermelho, que tinha mais ou menos quatro anos de assentados. Essas primeiras Romarias tentaram fortalecer esses movimentos. E até me parece que valeu: o número de assentamentos que a gente tem aqui na região é muito grande.[39]

Portanto, se no seio desses movimentos pela terra se gestaram tantos mártires, lembrá-los, a exemplo do que acontece na Romaria, é manter acesa a chama da luta, que, pelo que se pode entender da fala do Prof. Ivanildo, tem dado resultados, posto que muitos trabalhadores vêm conquistando um pedacinho de chão.

Assim, pode-se dizer que a Romaria dos Mártires tem como uma de suas finalidades lembrar às pessoas que dela participam, aqueles (as) que morreram em defesa da vida de outros; lembrar que Mártires são aqueles que não desistem da luta por uma vida melhor para seus semelhantes, mesmo que isso signifique morrer por esse ideal.

A Igreja Católica tem valorizado a presença desses mártires na construção de sua trajetória, o que é visível na Diocese de Rondonópolis, através das paróquias que a compõem, que buscam também avivar por meio da Romaria dos Mártires a memória dos seus fiéis, pois um povo sem memória é um povo sem identidades, sem resistência e sem história. É uma maneira de não deixar cair no esquecimento esses que tanto merecem homenagem e respeito pelo desempenho que tiveram em lutas coletivas por justiça social. Quem sabe assim, por meio dos exemplos deixados pelos Mártires ali homenageados, mantenha-se acesa a chama da solidariedade entre as pessoas, que estão cada vez mais distantes umas das outras, cada uma vivendo por si, sem preocupar-se com o seu semelhante.

Castro M. Bartolomé Ruiz pondera que as romarias “são constituídas com a significação de unir a fé com o compromisso social e político.”[40] Isso é perceptível na Romaria dos Mártires, pois quem dela participa pode observar o caráter religioso, social e político que a compõem através dos grupos ali reunidos, tais como as CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra), etnias indígenas, sindicatos e outros movimentos sociais e entidades organizadas. Também se percebe a presença de políticos, alguns por serem ligados a algum movimento social ou a grupos da Igreja Católica, e outros somente com o interesse de marcar presença em um evento que tem grande repercussão na imprensa, e que, obviamente, reúne um significativo número de eleitores.

 Mas, como surgiu a Romaria dos Mártires? Onde e quando teria tido início? Busquei essa resposta junto ao padre Giovane Pereira de Melo. Perguntei a ele se há algum livro que fale sobre o assunto. Contudo, ele não pode me precisar. No entanto, conversando com a professora da disciplina Monografia, Drª Laci Maria Araújo Alves, ela me disse que possuía um livro que mencionava os mártires e que falava sobre a primeira manifestação que se tornaria a Romaria dos Mártires.

Foi assim que tomei contato com o livro “Descalço sobre a terra vermelha”, de Francesc Escribano. Nele, o autor conta a vida de Dom Pedro Casaldáliga, bispo de São Félix do Araguaia, estado de Mato Grosso. Também registra a morte de alguns religiosos, tais como padre Rodolfo Lunkenbein, Padre João Bosco Penido Burnier, eles que foram amigos de Dom Pedro.

Francesc Escribano diz que o

povo de Ribeirão quis celebrar a missa de sétimo dia [da morte de padre João Bosco em 1976]. Depois da missa, fizeram uma procissão, que acabou na porta da delegacia na qual haviam sido torturado as duas mulheres e onde atiraram contra o sacerdote […] Os participantes da procissão derrubaram a delegacia e levantaram uma cruz em memória de João Bosco. Atualmente, a cruz está num local mais visível da cidade, ao lado da igreja de Ribeirão […] [que se] transformou no ‘Santuário dos Mártires da Caminhada’[41]

Parece ter sido dessa manifestação pública que teria se dado início à realização da Romaria dos Mártires pela Igreja Católica. Busquei outras fontes, mas não consegui encontrar nada a respeito, o que deixo como sugestão a futuras pesquisas.

O Professor Ivanildo José Ferreira disse que também não saberia dizer como a Romaria dos Mártires teria tido início em nível de Brasil. Contudo, ponderou que ela vem acontecendo em lugares onde têm ocorrido grandes conflitos, principalmente de terra. Lembrou de mortes acontecidas na região centro-oeste, como em Mato Grosso a morte do padre João Bosco Burnier; do padre Josimo Morais Tavares, no atual estado de Tocantins (que na época de sua morte era território de Goiás).

Lembrou ele ainda, que nas décadas de 1970 e 1980, no Brasil como um todo e também, de modo particular, no nosso município, havia inúmeros conflitos ligados a questões da terra e que houve muitas pessoas que se destacaram em lutas específicas, seja pelo direito de acesso à terra, à cidadania ou a outros direitos (lembremo-nos que, nesse período, viva-se no Brasil o regime militar, marcado pela perda de liberdades políticas, onde torturas, assassinatos, exílios compunham uma triste rotina).

Fazer romaria é uma tradição antiga em todas as religiões, culturas, povos e raças. Pode-se dizer que nas romarias estão imbricados temas culturais, sociais, políticos etc. Todas as romarias têm sempre um objetivo a alcançar, um sonho a realizar, uma meta a atingir.

A Romaria dos Mártires também se articula à Campanha da Fraternidade, à medida que todos os anos adota o lema que é trabalhado durante a mesma, que está sempre ligado a alguma problemática social.

Na trajetória percorrida pela Romaria dos Mártires, as multidões caminham, levam seus símbolos, tais como velas; água; rosário; imagens de santos etc.

Como participante, lembro que quando teve início, na década passada, rezava-se a dezena do terço, e em cada dezena se buscava refletir e responder a expectativas dos cristãos católicos. Durante o percurso, clama-se por justiça através da Palavra; dos cantos que são escolhidos, coerentes com suas temáticas; do teatro que é apresentado, a exemplo do que ocorreu em 2006 durante a procissão, com encenação da morte da Irmã Dorothy Stang, feita por jovens da Diocese. Enfim, de maneira geral, pode-se dizer que tudo que acontece durante a Romaria, os diferentes rituais que a compõem, tudo está ligado às problemáticas da terra, das mulheres, dos indígenas, dos negros, dos deficientes, dos idosos, dos jovens, do meio ambiente, das crianças etc.

A Romaria dos Mártires é uma experiência significativa, pois os romeiros podem demonstrar seus sonhos e expressar a sua realidade. É claro que cada pessoa tem um motivo particular que a impulsiona para essa caminhada, como dona Raulina Medeiros Quedes, 59 anos, moradora no Bairro Santa Cruz, participante desde a primeira Romaria dos Mártires que aconteceu em Rondonópolis, no ano de hum mil novecentos e noventa e dois. Disse-me ela:

eu gosto muito de participar dos movimentos, assim da Igreja, que é uma maneira de demonstrar aquele sentimento né? que a gente tem pelas pessoas que doaram suas vidas pelo bem da humanidade. Então, isso traiz assim pela época da Quaresma, é uma época de penitência, então, a gente faz um pouco também como penitência né? Então eu acredito que é um momento que a gente tira pra dar um testemunho da fé que a gente tem

Portanto, para ela, a Romaria dos Mártires é um momento de expressão da própria fé, no tocante ao respeito a elementos da tradição católica, e também uma expressão de reconhecimento àqueles que doam suas vidas na luta pelos seus semelhantes.

Dona Maria Beltrame, 40 anos, moradora no Bairro São Sebastião, falou-me que participa da Romaria há oito anos, porque “É um pouquinho de muitas coisas, por exemplo, a caminhada a gente encontra muitas pessoas, de muitos lugares.” Sobressai na sua fala essa pluralidade de lugares de onde vêem muitas pessoas, o que demonstra que a Romaria dos Mártires realizada em Rondonópolis – MT, extrapolou os limites do município.

O jovem José Carlos Souza Costa, 19 anos, é uma dessas pessoas que vem de um outro município para participar da Romaria dos Mártires.

Morador em Juscimeira, estado de Mato Grosso, ele me disse que participa há dez anos. Tem como objetivo com essa participação “Se unir em prol da comunidade, em prol das pessoas que precisa da nossa ajuda, fazer uma revolução como os jovens fizeram nos anos 80 e fazer mudar. Isso hoje precisa ser mudado entre as pessoas”.

Percebe-se na fala de José Carlos uma dimensão mais política na razão que o motiva a participar. Ao falar de “revolução” dos jovens nos anos 80, pode ser que esteja referindo-se à participação estudantil, por exemplo, no processo de redemocratização do Brasil, que foi muito significativa.

A Romaria dos Mártires, pelo que também pode ser percebido na fala de José Carlos, não é apenas um agrupamento de pessoas dispersas, se bem que têm muitos que vão apenas fazer um passeio; outros, para namorar, encontrar conhecidos; outros para “fazer política”, por intermédio do encontro com seus eleitores; outros por razões exclusivamente religiosas etc. Portanto, as motivações  até podem ser variadas, mas há uma clara demonstração de fé, de sonhos e de esperanças, ainda que não seja de todos.

Na Figura 3 abaixo, pode-se observar nos rostos das pessoas expressões que revelam sentimentos de fé, esperança e de luta, sentimentos que permeiam as romarias, pelo que eu mesma tenho podido sentir pela minha própria participação.

 

Figura 3: Rosto de Fé e Esperança

Fonte: Itamar Eduardo Gonçalves Oliveira.

 


UNIDADE IV

 

ELEMENTOS QUE CONSTITUEM A ROMARIA DOS MÁRTIRES

 

 

 

 

De um modo geral, pode-se dizer que numa perspectiva de homenagear os mártires, de promover uma demonstração de fé religiosa e também, de demonstrar engajamento em lutas sociais e políticas, é que no dia vinte e dois de março, do ano de hum mil novecentos e noventa e dois, por meio de trabalhos realizados pelo padre Giovane Pereira de Melo, Coordenador Diocesano da Pastoral à época, e de seus colaboradores, o bispo Diocesano Dom Osório W. Stoffel (Dom Osório faleceu no dia 10 de maio, de dois mil e dois (2002), aos 80 anos de idade, em Rondonópolis, MT); padre Lothar Bauchrowitz, vigário geral na época; do Professor Ivanildo José Ferreira e do Professor Ademar de Lima Carvalho, é que teve início a Romaria dos Mártires em Rondonópolis. Portanto, nesta data aconteceu a primeira Romaria dos Mártires em nossa cidade.

O Professor Ivanildo me contou que esse grupo, que fazia parte da Coordenação da Pastoral Diocesana, tomou algumas providências visando realizar o evento. Entre essas, o chamamento de outros coordenadores e coordenadoras de pastorais e de movimentos diocesanos, para colaborarem na sua organização; já esses, passaram a chamar mais colaboradores. E assim foram formando-se as condições necessárias à realização da 1ª Romaria.

 A primeira Romaria dos Mártires em Rondonópolis, estado de Mato Grosso, foi inspirada na caminhada dos mártires do estado, entre esses, de missionários que para cá vieram de outros países e que morreram em defesa da dignidade da pessoa humana, pelo evangelho, pela justiça etc.

O período escolhido para a realização da Romaria dos Mártires é a Quaresma[42]. Isso porque a Quaresma em si já traz uma proposta de conversão da mente e do coração humano, pois de acordo com o Padre Giovane Pereira de Melo, “O tempo de Quaresma em toda Igreja é o tempo de preparação para a Páscoa, tempo de ouvir com melhor disposição o apelo que Deus nos faz para sermos generosos, santos, mais fiéis ao compromisso do nosso batismo.”[43]

Nessa perspectiva religiosa vislumbrada na fala do Pe. Giovane, o romeiro faz a caminhada na certeza de que Deus está com ele, porque como disse Jesus: “Eu sou o caminho a verdade e a vida”, isto é, quem segue o caminho de Jesus, nele encontra vida, esperança e principalmente força para enfrentar os problemas e dificuldades do dia-a-dia.

Essa dimensão de fé cristã, pode-se observar também no que me disse em entrevista o jovem Edér Bruno dos Santos, morador do município de Pedra Preta, que participa há quatro anos da Romaria dos Mártires: “é uma emoção muito forte […] que nóis como estamos caminhando mais pra frente, pra Jesus, cada vez mais procurando a fé […] que a gente tem que ter muita fé em Jesus, cada vez mais procurando a fé...” [44]

Na minha pesquisa realizada a partir de registros diversos, encontrados na Diocese de Rondonópolis, Jornal A Tribuna, em fitas de vídeos e em entrevistas que fiz, observa-se uma grande união entre as paróquias para fazer que a cada ano a Romaria se torne um evento maior. É bastante perceptível que para alcançar esse intento, a Diocese tem contado, fundamentalmente, para a sua organização e realização, com os católicos agregados em diversas paróquias. É claro que a cada ano há uma certa variação dos organizadores

Inicialmente, pelo que se pode constatar nos registros com os quais lidei, há uma divisão de tarefas feita pelo grupo responsável pela realização da Romaria. Os trabalhos são divididos entre algumas equipes. Por exemplo: uma das Romarias sobre a qual encontrei a documentação, estava assim planejada a sua organização: a Paróquia Nossa Senhora Aparecida, sob a responsabilidade do Prof. Adilson José Francisco e seus colaboradores, ficou responsável pela animação da caminhada; a Paróquia Bom Pastor, sob a responsabilidade de Luciana Santana da Silva, Ana Lúcia e colaboradores, ficou responsável pela coreografia de abertura; a Paróquia Santa Terezinha, sob a responsabilidade de Helena e Eliane e colaboradores, ficou responsável pela ornamentação do altar; a Paróquia São José Esposo, sob a responsabilidade de Tânia Stoffel, Dety e algumas freiras e seus colaboradores, ficou responsável pela Procissão da Palavra (que é a entrada solene da Bíblia antes do rito da leitura); a Paróquia Sagrado Coração de Jesus sob a responsabilidade do frei Erivan Messias da Silva e colaboradores, ficou responsável pela dramatização do Evangelho; a Paróquia São José Operário ficou responsável pelo Ofertório; a Paróquia Santa Cruz ficou responsável pela Ação de Graça; a animação dos cantos da liturgia ficou sob a responsabilidade de Edílson José Buoci, Olímpio Alves, Sebastião, Ronaldo, Marisbela e seus colaboradores.

A realização da Romaria contou também com a colaboração de vários órgãos da cidade, públicos e particulares, como o 5º Batalhão de Polícia Militar de Rondonópolis, Corpo de Bombeiros, canais de televisão, como a TV Cidade e TV Centro América, rádio Clube, rádio Amorim Juventude, rádio Tropical FM-105, Jornal A Tribuna, Jornal Hoje, todos de Rondonópolis, Secretaria de Saúde, que disponibilizou ambulância para pronto atendimento, Coordenação Municipal de Desenvolvimento Urbano e de Transporte, entre outros.

Portanto, por meio da organização dessa Romaria, é possível se ter uma idéia da organização das demais, assim como de quantos recursos – humanos, materiais etc., são mobilizados para a sua realização.

Em todas as romarias, além de outros elementos que delas fazem parte, muitos cânticos acompanham toda sua trajetória. Alguns são escolhidos inicialmente pela comissão organizadora. Muitos deles se repetem todos os anos.  São cânticos que tem ligação com a trajetória do povo e que falam sobre os martírios vividos na sua caminhada. Selecionei alguns que têm sido comuns a quase todas as romarias que já foram realizadas, fazendo deles um registro e uma breve apreciação.

 

ROMARIA DA ESPERANÇA

 

Eu sou teu povo, eu sou/ em romaria vou/ Cantar o amor/ Vencer toda dor, eu sei que vou (bis).

1-Esta é a romaria da esperança/ convidando todos que quiserem vir/ por os pés nessa estrada sem bonança/ caminhando e aprendendo a repartir.

2-Nosso Deus nos convida a caminhar/ Deus dos pobres, Jesus libertador/ nessa marcha todo irmão tem seu lugar/ É o caminho da esperança e do amor.

3-Bendita e louvada seja a romaria/ Que caminha para a terra prometida/ Vence a morte e tantos males noite e dia/ e replanta nesse chão nova vida.

 

Como a música mesmo diz, a Romaria é uma caminhada de fé e de esperança. Uma caminhada que busca a libertação não somente do pecado, mas principalmente da opressão sofrida pelas pessoas devido às imposições do sistema capitalista, sistema este que historicamente tem primado pelos interesses individualistas, onde só quem possui alguma coisa é favorecido e tem valor reconhecido.

O canto chama as pessoas para se unirem em prol dos menos favorecidos que precisam de ajuda, “caminhando e aprendendo a repartir”.

BENDITA E LOUVADA

 

1-Bendita e louvada seja, esta santa romaria / Bendito o povo que marcha, bendito o povo que marcha, tendo o Cristo como guia. (bis)

Sou, sou teu Senhor / sou povo novo, retirante, lutador / Deus, dos peregrinos, dos pequeninos Jesus Cristo Redentor.

2- No Egito antigamente / do meio da escravidão / Deus, libertou o sue povo, hoje Ele passa de novo gritando a libertação. (bis)

3- Para a terra prometida, o povo de deus marchou / Moisés andava na frente, hoje Moisés é a gente, quando enfrenta o opressor. (bis)

 

Esse cântico é um clamor a Deus, pois segundo a Bíblia, Moisés quando caminhou com seu povo no Egito, em busca da terra prometida eles fizeram uma caminhada em romaria: andavam, cantavam, agradeciam e clamavam a Deus, como se faz hoje nas Romarias: apresentam-se os problemas, as lutas diárias e os agradecimentos.

 

O POVO DE DEUS NO DESERTO ANDAVA

 

1. Povo de Deus, no deserto andava/ mas à sua frente alguém caminhava./ O povo de Deus era rico de nada,/ só tinha a esperança e o pó da estrada.

Refrão[ Também sou teu povo Senhor,/ e estou nesta estrada,/ somente rua graça/ me basta e mais nada. (bis).

2. O povo de Deus também vacilava/ ás vezes custava a crer no amor./ O povo de Deus chorando rezava,/ pedia perdão e recomeçava.

Refrão[ Também sou teu povo Senhor,/ e estou nesta estrada,/ perdoa se ás vexes/ não creio em mais nada. (bis).

3. O povo de Deus também teve fome,/ e tu lhes mandaste o pão lá do céu./ O povo de Deus, cantando deu graças/ provou teu amor, teu amor que não passa.

Refrão[ Também sou teu povo Senhor,/ e estou nesta estrada,/ tu és alimento/ na longa jornada. (bis).

4. O povo de Deus ao longe avistou/ a terra querida que o amor preparou./ O povo de Deus, corria e cantava/ e nos seus louvores seu amor proclamava.

Refrão[ Também sou teu povo Senhor,/ e estou nesta estrada,/ cada dia mais perto/ da terra esperada. (bis).

 

Esse canto chama as pessoas para a caminhada em busca de justiça e pão para todos; a terra esperada, que é a terra para todos os oprimidos, para todos os famintos de pão e justiça.

 

PELOS CAMINHOS DA AMÉRICA

 

Pelos caminhos da América (3x) / Latino América!

1) Pelos caminhos da América, / há tanta dor tanto pranto / Nuvens, mistérios e encantos, / que envolvem nosso caminhar. / Há cruzes beirando a estrada, / pedras manchadas de sangue / apontando como setas / que a liberdade é pra lá.

2) Pelos caminhos da América, / há monumentos sem rosto / Heróis pintados, mau gosto. / Livros de história sem cor. / Caveiras de ditadores, / soldados tristes, calados / com olhos esbugalhados, / vendo avançar o amor.

3) Pelos caminhos da América, / há mães gritando, qual loucas / antes que fiquem tão roucas, / digam onde acharam. / Seus filhos, mortos, levados, / na noite da tirania, mesmo que matem o dia / elas jamais calarão.

4) Pelos caminhos da América, / no centro do continente, / marcham punhados de gente, / coma a vitória na mão. / Nos mandam sonhos, cantigas, / em nome da liberdade, / com o fuzil da verdade / combatem firme o dragão.

5) Pelos caminhos da América, / bandeiras de um novo tempo, / Vão semeando ao vento, / frases teimosas de paz. / Lá na mais alta montanha, / há um pau d’arco florido. / um guerrilheiro ferido / que foi buscar o amanhã.

6) Pelos caminhos da América, / há um índio tocando flauta, / que o sistema lhe impôs. / No violão um menino, / e um negro toca tambores, / há sobre a mesa umas flores, / pra festa que vem depois.

 

A América Latina, desde a invasão dos europeus, vive em constantes conflitos, ora por clamar por liberdade, ora por imposição de governantes tiranos. Nela, vivem pessoas subjugadas pelo sistema, em que poucos são respeitados; pessoas que são violentadas no mais fundo do seu âmago, onde lhes é imposta uma nova cultura, que lhes subtrai antigos costumes, crenças, valores etc. Ou ainda, o sistema lhes impõe uma guerra, em que são obrigados a dar suas vidas, deixando de lado seus sonhos, uma guerra que não é sua, uma guerra em que só os governantes e as elites terão benefícios.

A América Latina sangra e muitas vezes as pessoas não sabem o que fazer, já que o sistema político e financeiro não dá nenhuma - ou pouca chance para uma reação. Quando há uma reação, esta é logo liquidada, como é o caso dos aborígines, que tentam até hoje se libertar das amarras desse sistema.

 

QUANDO O DIA DA PAZ RENASCER

 

1. Quando o dia da paz renascer, quando o sol da esperança brilhar eu vou cantar. Quando o povo nas ruas sorrir e a roseira de novo florir eu vou cantar. Quando as cercas caírem no chão, o quando as mesas se encherem de pão eu vou cantar. Quando os muros que cercam os jardins destruídos, então os jasmins vão perfumar!

Refrão: Vai ser tão se ouvir a canção cantada de novo. No olhar do homem a certeza do irmão reinado do povo.

2. quando as armas da destruição destruídas em cada nação eu vou sonhar. E o decreto que encerra a pressão assinado só no coração vai triunfar. Quando a voz da verdade se ouvir e a mentira não mais existir será enfim, tempo movo de eterna justiça sem mais ódio, sem sangue ou cobiça, vai ser assim.

 

Percebe-se a esperança num novo amanhã. A esperança de uma Terra livre de todos os males da ganância, das guerras.  Uma terra onde haja amor, paz e justiça.

 

MOMENTO NOVO

 

1- Deus chama a gente pra um novo mundo/ de caminhar junto com o povo. / É hora de transformar o que não dá mais / sozinho, isolado, ninguém é capaz.

Por isso vem, / entra na roda também! / Você é muito importante! Vem (bis)

2- Não é possível crer que tudo é fácil; / há muita força que produz a morte / gerando a dor, tristeza e desolação. / É necessário unir o cordão!

3- A força que hoje faz brotar a vida, / atua em nós pela sua graça. / É Deus quem nos convida pra trabalhar: / o amor repartir e as forças juntar.

 

O canto é um chamamento para que as pessoas se unam em romaria em busca de transformações, porque como o canto mesmo diz, nada é fácil. Tudo se consegue por meio de lutas e de perseverança.

 

BANDEIRA DE LUTA

 

Traga a Bandeira de luta. Deixa a Bandeira passar. / Essa é a nossa conduta, / vamos unir pra mudar. (bis)

1) Deixe fluir a esperança porque na lembrança vamos resgatar. / Guardada bem na memória, a nossa história vai continuar.

2) Baticundun na Bandeira, o baticundum da mudança chegou. / É na roça, é na cidade, na sociedade sou trabalhador.

3) temos um projeto novo a cidadania no libertador / Não fique fora parado se junte à moçada é nessa que eu vou.

4) Você um jovem consciente ajude a gente se organizar. / Buscando a cidadania e no dia-dia vamos chegar lá.

 

Nas Romarias dos Mártires sempre é levada a bandeira dos mártires em sinal de esperança e como uma forma de lembrar aqueles que doaram suas vidas em busca de mudanças: de cidadania para todos deste continente latino-americano; são lembrados os tantos que já deram suas vidas. A tarefa hoje é nossa para que o pobre amanhã possa ter a terra garantida. Esse tem sido também um papel da Igreja Católica hoje junto à sociedade, isto é, ela tem também o papel de abrir os olhos de quem não quer enxergar o que se passa em nossa sociedade.

 

RELIGIÃO LIBERTADORA

 

É por causa do meu povo machucado / que acredito em religião libertadora / É por causa de Jesus ressuscitado / que acredito em religião libertadora.

1) É por causa dos profetas que anunciam, que batizam, que organizam e denunciam. / É por causa de quem sofre a dor do povo. É por causa de quem morre sem matar.

2) É por causa dos pequeninos e oprimidos. Dos seus sonhos, dos seus ais, dos seus gemidos. / é por causa do meu povo injustiçado. / Das ovelhas sem rebanho e sem pastor.

3) É por causa do que fez João Batista. Que arriscou, mas preparou a tua vinda. / É por causa de milhões de testemunhas / que apostaram suas vidas no amor.

 

Por meio do canto dá para perceber que a Igreja Católica está cada vez mais engajada na luta pela resolução de problemas sociais. E busca através da memória de seus mártires avivar a consciência das pessoas, lembrando aqueles que morreram (e que continuam a morrer), por uma causa nobre em favor dos mais pobres.

IRÁ CHEGAR

 

Irá chegar um novo dia / um novo céu uma nova terra, um novo mar. / E nesse dia os oprimidos, / numa só voz a liberdade irão cantar.

1) Na nova terra o negro não vai ter correntes, / e o nosso índio vai ser visto como gente. / Na nova terra o negro, o índio, o mulato, / o branco e todos vão comer no mesmo prato!

2) Na nova terra a mulher vai ter nome. / Vai caminhar lado a lado com o homem. / Na nova terra Oneide, Rosa, Margarida, mulheres todas vão dançar ao Deus da Vida.

 

A letra busca incentivar a luta por um novo mundo, onde todos possam ser iguais, sem distinção de cor, sexo ou etnia. Uma terra sem as amarras das elites, que só oprimem os menos favorecidos.

 

SANTA MÃE MARIA

 

1)Santa Mãe Maria, nessa travessia, cubra-nos com teu Manto cor de anil / Guarda nossa vida, Mãe Aparecida, Santa Padroeira do Brasil.

Ave Maria, Ave Maria (bis).

2) Com amor divino guarda os peregrinos nesta caminhada para o além! Dá-lhes companhia, pois também um dia foste peregrina de Belém.

3) Mulher peregrina, força feminina, a mais importante que existiu. / Com justiça queres que nossas mulheres, sejam construtoras do Brasil.

 

Como o canto mesmo diz, assim como Maria, mãe de Jesus, durante os sofrimentos que seu filho passou, assim são nossas mulheres mártires, que mesmo com a presença constante da morte em suas vidas, elas jamais fugiram da luta.

 

ACORDA AMÉRICA

 

Acorda América, chegou a hora de cantar / O sangue dos Mártires fez a semente se espalhar: (bis)

1) Nestes campos, nessas raízes entrelaçadas de etnias tão misturadas / É     assim meu povo a nossa América Latina.

 2)Meu irmão índio, meu irmão negro, meus latinos companheiros / Nós somos vítimas das dependências de um império estrangeiro / É assim meu povo a nossa América Latina.

3) Eu me pergunto e a nós todos, até que dia nós agüentamos essa violência? / Tomam as terras, matam os índios, nos deixam restos de nossa América Latina.

 

A nossa realidade é vergonhosa. As favelas, os pobres, o subemprego, o salário mal pago, o não reconhecimento como pessoa, nem como empregado. Vivemos em um mundo onde a desilusão já é parte da vida de muitos; em que muitos não sabem o que é respeito, lealdade, honestidade etc. Esse canto convida a uma reflexão sobre como vive a sociedade latino-americana nos dias atuais, e que a mudança só é possível através da luta e da resistência do povo.

De uma maneira geral, pode-se dizer que os cantos permitem uma reflexão capaz não só de aguçar a fé religiosa, mas também de chamar a atenção para problemas sociais, políticos, econômicos, culturais, ambientais etc., o que no meu entendimento contribui para a construção de uma nova consciência, capaz de humanizar a sociedade que tanto carece do conhecimento e da prática de valores humanistas.


UNIDADE V

 

CAMPANHA DA FRATERNIDADE E OS LEMAS DAS ROMARIAS

 

Nesta unidade, registro as romarias com os lemas que incorporaram da Campanha da Fraternidade[45].

A primeira Romaria dos Mártires, como já disse anteriormente, foi realizada no dia vinte e dois de março, de hum mil novecentos e noventa e dois (1992). Ela teve como lema “Juventude - caminho aberto", mesmo tema da Campanha da Fraternidade.

Ao incorporar o lema da CF, a Romaria dos Mártires objetivou trazer para reflexão os jovens que não buscam mais as coisas de Deus em suas vidas, principalmente nos dias atuais, marcados pelo consumismo e violência.

Na minha avaliação, o resultado foi bastante positivo, pois como participante pude observar que  muitos jovens se fizeram presentes, e que a cada ano eles têm estado mais participativos, seja por meio da dança, do teatro ou na própria organização das romarias.

 

Figura 4: Jovens na Romaria

Fonte: Maria Aparecida Gonçalves.

 

A Romaria sempre traz lemas da Campanha da Fraternidade, estes que têm estado ligados aos anseios da sociedade, com as carências que muitos setores desta vivem e que precisam enfrentar.

O Professor Ivanildo disse que nós podemos dizer que é uma das partes, um dos elementos, complemento da Campanha da Fraternidade se nós considerarmos que a Campanha da Fraternidade é uma oportunidade de evangelização dos cristãos católicos e dos cristãos em geral. Ela é um chamado à conversão.

Nesse sentido, a Romaria dos Mártires é um momento dessa evangelização no contexto da Campanha da Fraternidade. Não se liga diretamente à Campanha da Fraternidade, porque ela pode obedecer aos chamados, aos reclames, às necessidades particulares da Igreja Diocesana, de Rondonópolis-MT, por exemplo. Então, ela pode ter temas destoantes [da Campanha da Fraternidade], se a realidade de Rondonópolis assim o ensejar.

A segunda Romaria dos Mártires aconteceu no dia vinte e um de março, do ano de hum mil novecentos e noventa e três (1993), com o lema “Caminhamos buscando a vida, a esperança e a cidadania plena”.

Como sabemos, a cidadania é expressão de um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida em sociedade. Hoje, quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social. E a Igreja Católica trabalhando esse tema na Romaria, busca reverter esse processo de exclusão da cidadania.

A terceira Romaria aconteceu no dia vinte de março, de hum mil novecentos e noventa e quatro (1994), com o lema “Em busca da vida, o compromisso e a responsabilidade da família e da sociedade”.

Esse lema foi escolhido porque aquele foi o ano internacional da família, e a Diocese como vem fazendo nesses anos de realização da Romaria dos Mártires, trouxe para reflexão no evento a celebração da vida e também da morte, que estão presentes constantemente nas famílias.

No dia vinte e seis de março, do ano hum de mil novecentos e noventa e cinco (1995), com o lema da Campanha da Fraternidade “A Fraternidade e os Excluídos”, a Diocese realizou a quarta Romaria. Conclamou-se, durante a sua realização, a participação de todos na busca pela liberdade e igualdade entre as pessoas, para que não haja mais discriminação e exclusão.

Na edição da quinta romaria, ocorrida no dia vinte e quatro de março, do ano de um mil novecentos e noventa e seis (1996), além da homenagem aos mártires, foi incorporado o lema da Campanha da Fraternidade daquele mesmo ano: “Justiça e paz se abraçarão!”.

Foi um momento de grande apelo pela paz no mundo. Por ser um ano em que aconteceriam eleições municipais em todo território nacional, a Diocese de Rondonópolis trouxe também essa temática para a Romaria, com a finalidade de discutí-la. Quis assim contribuir para a formação política dos cristãos, para que exerçam sua cidadania como sujeitos na construção de uma sociedade justa e solidária, e para que percebam que a política é algo que envolve todas as relações humanas, desde a convivência familiar, a participação na escola, na comunidade, nos sindicatos, associações e em todo e qualquer tipo de organização. Exercer a função política de maneira coerente é também contribuir para a paz entre os cidadãos e cidadãs.

A sexta Romaria aconteceu no dia dezesseis de março, de hum mil novecentos e noventa e sete, com o lema “Rumo ao novo milênio com os mártires da caminhada” (1997). A Igreja procurou por meio de reflexões sobre o lema, fazer com que as pessoas não esqueçam nunca da memória daqueles que sofreram o martírio, testemunho importante e inesquecível como estímulo às lutas sócias e políticas.

A sétima Romaria dos Mártires foi realizada no dia vinte e um de junho, de hum mil novecentos e noventa e oito (1998). Além da homenagem aos mártires, a sexta Romaria trabalhou com o lema “A Serviço da Vida e da Esperança”. Enfocou, por meio dele, a educação em seu sentido amplo.

Percebe-se que através da Romaria dos Mártires a Igreja Católica quer não só evangelizar, mas contribuir para a transformação social, pois o Brasil tem um grande índice de analfabetismo, o que tem colaborado para a existência do desemprego, violência, corrupção, imoralidade, poluição, impunidade, desertificação da terra, dignidade humana cada vez mais desrespeitada e agredida, o que tem levado a uma forte queda na esperança do povo, especialmente, entre os pobres, os oprimidos e os excluídos.

Sabemos que uma mudança profunda - que se faz necessária não só no nosso país, somente poderá ocorrer com uma educação que atinja a globalidade do ser humano, constituindo-se em elemento formador do cidadão; que valorize também o aspecto informal, isto é, aquilo que se pode aprender na família, nos vários ambientes da sociedade, fora das escolas, ou seja, uma educação digamos que multidisciplinar e multicultural, possibilite à pessoa uma postura positiva e madura na sociedade e no mundo, considerando as relações quotidianas, as experiências afetivas e efetivas, tirando assim os menos favorecidos do individualismo e da exclusão social; possibilitando a recuperação e a garantia de  direitos que têm sido historicamente negados etc.

No dia vinte e um de março, de hum mil novecentos e noventa e nove (1999), a oitava Romaria que teve como lema “Sem trabalho... por quê?”, focalizou a situação dos desempregados, especialmente em nossa cidade. Chamou os seus participantes a fazerem um exame de consciência para enxergar o problema e suas decorrências, orientando-os para viverem em comunhão com os menos favorecidos e com os marginalizados, ajudando-os, sendo solidários, para que todos tenham a dignidade do trabalho. Problematizou-se o fato de que num país como o nosso, com tantas riquezas, poucos têm muito e a maioria não tem direito a nada ou a quase nada.

Abordou-se o problema, falando de modo especial do Brasil, relacionando-o ao agravamento da dependência que aumenta a cada dia em relação ao capitalismo, com a opressão e a exclusão gerada por esse sistema, que tem feito aparecer cada vez mais o aumento do número de desempregados, especialmente entre os mais pobres.

E é essa diferença econômica e social que a Igreja Católica tem buscado discutir, com o intuito de contribuir à formação de uma nova consciência pela população, para que volte seus olhares a essas diferenças, para o número gritante de desempregados, muitos que até já perderam sua dignidade; para que todos possam ter trabalho adequado, proporcionando bem-estar para si e sua família.

É no processo de lutas por mudanças desse tipo de realidade, que já se fez muitos mártires, porque como situei noutros momentos desse texto, esses acabam dando suas vidas na busca de resolução para os problemas existentes.

Vemos que enquanto muitos jovens e adultos não conseguem entrar no mercado de trabalho, muitas crianças trabalham desde cedo, seja como engraxate ou quebrador de pedras, como diariamente é denunciado nos jornais, o que representa a supressão da infância por meio da abominável prática do trabalho infantil.

No dia dois de abril, do ano de dois mil (2000), começo de um novo milênio, com o lema da Campanha da Fraternidade “Novo Milênio sem Exclusão”, e em comemoração aos quinhentos anos de Evangelização da Igreja Católica no Brasil, realizou-se a nona Romaria dos Mártires.

Foi dada uma maior ênfase aos negros, aos índios, já que esses foram os grupos humanos mais explorados com a chegada dos europeus ao Brasil, o que perdura, tendo até aumentado sobre os mesmos a violência, nas formas de discriminação e preconceito. Também foi dada ênfase às mulheres, que têm sofrido as mais diversas formas de violência, a começar pelas suas próprias casa, dentro de suas próprias famílias. Ainda, à necessidade do regaste das dívidas sociais, de diferentes ordens: educação; saúde, moradia etc. Foi lembrado durante a Romaria o martírio sofrido pelos religiosos ou leigos, ao longo desses quinhentos anos.

Segundo o jornal A Tribuna[46], a realização da Romaria dos Mártires veio em um momento bem oportuno, pois no dia trinta e um de março fora o aniversário do golpe civil-militar, que aconteceu no ano de hum mil novecentos e sessenta e quatro (1964), regime esse marcado pelo autoritarismo, supressão dos direitos constitucionais, perseguição policial e militar, prisão e tortura dos seus opositores etc.

Menciona o artigo que nessa época navios saiam carregados de alguns portos do país, com centenas de pessoas que defendiam as reformas de base pregadas pelo ex-presidente João Belchior Marques Goulart (Jango Goulart), e seus aliados, e por representantes de organizações da sociedade civil organizada, que clamavam por mudanças.

Diz a matéria que esses barcos iam lotados e voltavam sempre vazios. Pessoas foram martirizadas por defender a solução para questões sociais; por lutar por uma sociedade justa e igualitária. Um regime político que entre outros disfarces, disfarçara-se de democrático  e cristão, sufocando o grito de muitos que tiveram a coragem de sair às ruas para defender os oprimidos pelos interesses políticos e econômicos vigentes no país, que historicamente vem beneficiando as elites nacionais e internacionais.

Segundo essse mesmo artigo, a maioria desses mártires anônimos era cristã, sendo católica ou evangélica.

A Pastoral Diocesana demonstra em oportunidades como essas, das romarias, o seu engajamento nas lutas pela superação da opressão e exclusão social através do resgate das dívidas sociais, como por exemplo, lutando pela garantia do acesso à terra através da reforma agrária, que contemple as necessidades do homem e da mulher do campo, e também em defesa da implantação de uma política geradora de emprego.

No dia dezoito de março, de dois mil e um (2001), a Romaria dos Mártires, na sua décima edição, trouxe o lema “Sim à vida, não às drogas”. A Diocese por meio da Romaria buscou discutir esse grave problema a partir das contradições existentes entre o sonho de vida plena, prazerosa, harmoniosa e a dura realidade cotidiana, marcada pela competição de todos contra todos. Ao recorrer às drogas, seja ela cocaína, o tabaco e o álcool, e outros tipos de drogas existentes, para aliviar as tensões do cotidiano, muita gente transforma seus sonhos em pesadelo; o vício se torna uma doença  que mata aos poucos e destrói famílias, atingindo principalmente indivíduos menos protegidos ou em condições psicológicas fragilizadas.

Dom Juventino Kestering dizia na ocasião que “a Romaria quer fazer com que os cristãos assumam o seu compromisso de comunidade, de família, de jovens e sua responsabilidade social”[47].

Na Romaria do dia dezessete de março, de dois mil e dois (2002), enfocou-se o lema “Por uma terra sem males”, ligado à questão da má distribuição de terra. Era a décima primeira edição da Romaria dos Mártires.

Nela, refletiu-se sobre a abundância de terra nas mãos de poucos grandes latifundiários, enquanto a maioria da população, incluindo aí, é claro, as etnias indígenas, vivem à míngua, sem um pedaço de chão para viver e trabalhar, como é o caso dos índios Terena, que nos estados de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso há mais de vinte anos lutam por um pedaço de terra para serem assentados e criar suas famílias. Dessa maneira, Romaria dos Mártires demonstrou o engajamento na defesa de terras indígenas e de outros direitos.

A etnia indígena se fez representar na Romaria (e não só nesta, diga-se de passagem), com os Bororo e os Terena, que vivem em aldeias próximas à cidade de Rondonópolis.  A participação deles foi de grande importância para destacar o lema da Campanha da Fraternidade daquele ano.

Segundo o Jornal A Tribuna do dia dezenove de março, de dois mil e dois, os índios Bororo, da aldeia Tadarimana de Rondonópolis, e de General Carneiro, estado de Mato Grosso, juntaram-se aos Terena, na Romaria dos Mártires, para expor seus problemas para a sociedade rondonopolitana e pedir uma maior cooperação e compreensão dos brancos, principalmente na preservação de suas terras, pois como se não bastasse o que ocorreu no passado com esses aborígenes, a invasão de terras continua, à medida que os madereiros e mineiros continuam com a sua busca de riqueza fácil como dantes, não importando a quem estão prejudicando.

No dia vinte e três de março, do ano de dois mil e três (2003), foi realizada a décima segunda Romaria dos Mártires, que buscou, além de manter viva a memória dos mártires, por meio do lema da Campanha da Fraternidade “Vida, dignidade e esperança”, refletir sobre a inclusão dos idosos na sociedade; também, conscientizar as pessoas sobre a responsabilidade que todos devem ter diante da grave situação dos idosos no país, pois muitos deles vivem abandonados pela família e muitas vezes são jogados em asilos, sofrendo todo tipo de preconceito, tendo assim, sua dignidade desrespeitada.

João Paulo II dizia que

os anciãos ajudam a contemplar os acontecimentos terrenos com mais sabedoria...eles são os guardiões da memória coletiva e por isso, intérpretes privilegiados daquele conjunto de ideais e valores humanos que mantêm e guiam a convivência social. Excluí-los é como rejeitar o passado, onde penetram as raízes do presente, em nome de uma modernidade sem memória[48]

Refletindo essa citação tirada da Carta do Papa João Paulo II aos Anciãos, é possível pensar sobre a realidade opressora e excludente imposta aos idosos neste país, tanto pela sociedade quanto pelos próprios familiares, que jogam essas pessoas em qualquer lugar, como se fossem imprestáveis, como se já não servissem para mais nada. Como diz o Papa João Paulo: eles são as visões do passado; é por meio da vivência deles que se pode continuar a planejar o futuro, observando os erros e os acertos que eles cometeram no passado.

Outro lema da Campanha da Fraternidade enfocado por uma das romarias foi “Água Fonte de Vida”, esta que foi realizada no dia treze de março, de dois mil e quatro (2004). Foi a décima terceira edição da Romaria dos Mártires. Nela, procurou-se contribuir à formação de uma  maior consciência contra o mal uso da água, porque a tendência é desta ficar cada vez mais escassa.

Naquele ano, a Romaria teve um significado especial, pois interpelou os cristãos e toda sociedade para a defesa, preservação e cuidado da água.

Como disse Dom Juventino Kestering na ocasião, “Água é fonte de vida. Sem água ninguém vive. O planeta terra passa por uma grave crise de água. Já são milhões de seres humanos que tem o acesso dificultado à água potável.”[49].

No dia treze de março, de dois mil e cinco, com o tema da Campanha da Fraternidade “Felizes os que promovem a Paz”, foi realizada a décima quarta Romaria dos Mártires, que trouxe para reflexão a importância de se fazer a paz, pois vivemos em um mundo onde a violência, a injustiça, a individualidade etc., procuram ditar as regras.

A décima quinta Romaria dos Mártires foi realizada no dia 26 de março de 2006, quarto domingo da Quaresma. Teve como lema “Levanta-te e vem para o meio”, o mesmo lema da Campanha da Fraternidade.

Como já foi mencionado, a Romaria é um grande momento para a evangelização, e um de seus objetivos é promover atitudes de verdadeira fraternidade e a verdadeira cultura da solidariedade social. Sabemos que no Brasil, hoje, há cerca de 14,5% de pessoas com alguma deficiência, oprimidas e excluídas de alguma forma. Sendo assim, a Diocese de Rondonópolis percebeu que era necessário levantar também a sua voz, fazendo da Romaria um momento para chamar os participantes para lutar pelos direitos dessas pessoas. Buscou conclamar a sociedade a ter gestos concretos de inclusão social para as pessoas com deficiência.

Portanto, temáticas das mais diversas têm dado vida às romarias, permitindo aos caminhantes sobre elas refletirem, sendo estes convidados à uma participação mais ativa nas lutas sociais e políticas, contra a opressão e a exclusão, a favor da garantia de dignidade para todos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

UNIDADE VI

 

OS MUITOS PERCURSOS DA ROMARIA DOS MÁRTIRES EM RONDONÓPOLIS-MT

 

A concentração da primeira Romaria foi em frente à paróquia Santa Cruz (hoje Catedral), situada à Rua Frei Servácio, no Bairro Santa Cruz, às dezesseis horas. Já, o local da celebração eucarística, fora na paróquia Nossa Senhora Aparecida, situada na Avenida Sagrada Família, na Vila Aurora.

Em uma conversa informal com uma das participantes daquela Romaria, a Professora Laci Maria Araújo Alves, ela me disse que lembrava do percurso feito pela mesma, que fora a Rua Rio Branco, saindo da Catedral rumo à Igreja N. S. Aparecida. Da maneira como ocorrera, o trajeto foi feito na contra-mão. Daí o padre Giovane ter dito que durante a Romaria se estava “caminhando na contra-mão”, e que tem sido assim com os mártires, que caminham na contra-mão do que quer essa sociedade capitalista.

 Por ser o primeiro ano de edição, houve uma grande participação da população de Rondonópolis, que foi às ruas em demonstração de fé, demonstrando acreditar que acima de tudo tem esperanças.

Segundo a avaliação feita pela Pastoral Urbana e pela Coordenação Diocesana[50], a primeira edição da Romaria foi um marco na história da Igreja Católica em Rondonópolis.

Para que um evento dessa envergadura desse certo é claro que foi preciso a união das comunidades católicas, pois o trabalho de organização é demasiadamente grande, ainda mais em se tratando ser primeira Romaria. Também, os veículos de comunicação deram toda cobertura desejada, tendo sido anunciada em jornais, rádios e canais de televisões locais, o que certamente contribuiu para uma maior informação à população.

O vereador e líder do PT (Partido dos Trabalhadores), à época, Senhor José Ferreira Lemos Neto (Juca Lemos), assim avaliou aquela primeira Romaria dos Mártires:

 Este momento entrará para a história como sendo de grande sensibilidade com todos aqueles que ‘deram’ suas vidas em defesa do direito à cidadania aos marginalizados pela sociedade […] Os mártires são frutos de uma sociedade injusta, desigual e violenta. Com certeza, todos nós que estávamos naquela Romaria, gostaríamos que todos ali lembrados estivessem entre nós porque nossa busca é pela sociedade justa e não de mártires. Mas jamais poderíamos esquecer destas pessoas que fazem de suas vidas instrumentos de luta pela sociedade justa e fraterna […] Rondonópolis jamais viu uma multidão tão grande em suas ruas. Isso mostra uma Igreja vigilante e compromissada na busca de uma redefinição social. Cada passo dado por cada pessoa na romaria, será instrumento na caminhada de uma sociedade nova. A Igreja deu mais que um grande passo nesta direção. É por isso que aplaudimos e participamos da Romaria.[51]

 

E assim, a cada novo ano, a Diocese de Rondonópolis está cada vez mais engajada na organização e realização junto com seus colaboradores da Romaria dos Mártires, não unicamente para homenagear os mártires como já foi dito, mas também para chamar a atenção da sociedade para os problemas sociais que existem nesta cidade, para a necessidade de buscar conjuntamente, soluções aos mesmos. 

Com uma participação cada vez maior da população rondonopolitana nas romarias,  nelas percebe-se a presença de pessoas de realidades sociais bem diferenciadas. Pessoas pobres e de classe média estão cada vez mais presentes. É verdade que se percebe a presença de pessoas de grupos sociais mais abastados. Há também a presença de pessoas de municípios próximos a Rondonópolis, que a cada ano estão mais participativas: 1-Primavera do Leste; 2 - Campo Verde; 3 - São José do Povo; 4 - Pedra Preta; 5- Guiratinga; 6 - Poxoréu; 7- Juscimeira; 8- Jaciara; 9 - Dom Aquino; 10- São Pedro da Cipa; e de municípios de outras regiões do estado.

Nesses grupos de visitantes, pode-se notar a presença de adultos, mas a grande maioria são jovens. Como a jovem Bárbara Mascarenhas, de vinte e dois anos, secretária paroquial, moradora do município de Juscimeira, Mato Grosso, que participa há seis anos. Quando perguntei para ela o que a traz para essa caminhada, ela me disse que

é uma procissão né? dos fiéis que estão lutando pela causa né? da Campanha da Fraternidade. É uma devoção dos fiéis que somos por essa luta […] eu acho a Romaria uma das caminhadas muito importante na nossa diocese, muito importante mesmo.

A concentração de pessoas de todas as paróquias de Rondonópolis, quanto de outros municípios do estado de Mato Grosso, para o início da caminhada, é sempre às dezesseis horas. Já, o lugar de concentração, assim como o percurso e o local de finalização têm sido variáveis.

A primeira Romaria, como já situei, teve sua saída da Catedral Santa Cruz (que na época era ainda paróquia), situada no bairro Santa Cruz. Os romeiros caminharam pela Rua D. Pedro II até a paróquia N. Srª. Aparecida, situada na Rua Sagrada Família, na Vila Aurora.

Já, a segunda Romaria, esta saiu do Estádio Engenheiro Lutero Lopes, à época situado na Avenida Bandeirantes. Os romeiros caminharam pela mesma Avenida, até a paróquia São José Operário, pela a Vila Operária.

Na terceira Romaria, a saída foi da Praça dos Carreiros (centro). Os romeiros caminharam pela Avenida D. Pedro II, pela Avenida Marechal Dutra, passando pela  ponte da Vila Cardoso, seguindo pelo itinerário do ônibus até à Avenida Brasil, em direção à Comunidade Sagrada Família, no Bairro São Sebastião I.

Já, a quarta Romaria, esta teve sua saída da Praça dos Carreiros. Os romeiros caminharam pela Avenida D. Pedro II até a Catedral Santa Cruz.

Na quinta Romaria, o ponto de saída foi da Catedral Santa Cruz. Os romeiros caminharam pela Avenida Dom Pedro II, pela Avenida Bandeirantes, indo até o Estádio Engenheiro Lutero Lopes. 

A sexta Romaria teve sua saída da Praça dos Carreiros. Os romeiros caminharam pela Avenida D. Pedro II até o Estádio Engenheiro Lutero Lopes, à época situado na Avenida Bandeirantes.

Já, a sétima Romaria, ela saiu da Praça dos Carreiros (centro). Os romeiros caminharam pela Avenida D. Pedro II indo até o Estádio Engenheiro Lutero Lopes.

A oitava Romaria saiu da Catedral Santa Cruz. Os romeiros caminharam até o Conjunto Marechal Rondon, no bairro de igual nome.

Na nona Romaria a saída foi da Praça dos Carreiros. Os romeiros caminharam pela Avenida D. Pedro II indo até a Catedral Canta Cruz.

A décima Romaria teve o mesmo percurso da primeira, pois saiu da Praça dos Carreiros. Os romeiros caminharam pela Avenida D. Pedro II indo até a Catedral Santa Cruz.

Já, a décima primeira Romaria, ela saiu da Praça da Saudade. Os romeiros se dirigiram até o Ginásio de Esporte Marechal Rondon, situado na Rua Poxoréu, esquina com a Avenida Rui Barbosa, no centro da cidade.

Quanto a décima segunda Romaria, esta saiu da Catedral Santa Cruz. Os romeiros caminharam até a Paróquia Santa Terezinha, situada na Rua Rio Grande do Sul.

A décima terceira Romaria saiu da Praça da Saudade. Os romeiros caminharam pela Avenida Rui Barbosa, Avenida Francisco Félix, Avenida Cuiabá, indo até o Porto do Cais, marco histórico de Rondonópolis, situado às margens do Rio Vermelho, na Rua Rosa Bororo, encontro com a Avenida D. Wunibaldo Talleur.

Já, a décima quarta Romaria, saiu da Praça da Saudade. Os romeiros caminharam pela Rua José Barriga indo até a Rua Irmão Bernardes, no Conjunto São José.

Quanto a décima quinta Romaria, esta teve sua saída da Catedral Santa Cruz. Os romeiros caminharam pela Avenida Frei Servácio, pela Avenida Fernando Correia da Costa, passando pela Avenida Presidente Médici, subindo pela Avenida Ary Coelho, na Vila Birigui, seguindo pela Avenida José Pinto indo até o centro de eventos da paróquia Santa Terezinha, na Rua Rio Grande do Sul.

Como foi possível perceber, se em alguns anos as romarias tiveram percursos diferentes; noutros, no entanto, eles se repetiram. Infelizmente, não consegui o registro completo de muitos dos percursos feitos, o que deixo como sugestão para futuras pesquisas.

O que eu gostaria de ressaltar ainda, é que os percursos feitos pelas romarias configuram uma outra espacialidade à cidade: a espacialidade das romarias, a espacialidade dos romeiros, construída pela Igreja Católica, por meio da ação de suas várias paróquias, e de apoiadores, tais como entidades, outras instituições, movimentos sociais etc., uma espacialidade que decorre do caminhar de milhares de pessoas – católicas ou não; cristãos ou não; portanto, que além da fé cristã que têm a possibilidade de manifestar no trajeto que percorrem, também são convidadas nele a refletir problemáticas sociais, posto que todos são conclamados ao  engajamento em lutas pelo direito à dignidade humana, por justiça social.

Já,  em sua finalização, sempre há um palco montado para fazer o encerramento, seja em estádio, ginásio de esporte ou no meio de uma rua/avenida.A Romaria sempre é encerrada com uma missa, que é composta pelos ritos iniciais, ato penitencial, liturgia da palavra, liturgia  eucarística e ritos finais.

Na Romaria dos Mártires, volto a dizer, é sempre feita uma homenagem à memória dos mártires, pois suas mortes estão carregadas de vida de pessoas oprimidas e marginalizadas, de pessoas excluídas da vida em sociedade e principalmente, dos excluídos da terra, porque eles morreram em busca da liberdade e de uma distribuição de terra e de renda mais justa. Sempre é proposto aos romeiros assumirem o compromisso de continuar a caminhada e a luta dos mártires, pois só assim suas lutas e seus sonhos se tornarão válidos. É por isso que a cada Romaria os participantes conquistam uma maior consciência e se solidarizam de modo especial com todos aqueles que não têm uma vida digna. As pessoas são levadas a refletir a realidade de nosso país, de nosso estado, da cidade em que vivem, do bairro em que moram etc., a fim de que percebam o quanto há por se fazer, para que todos tenham uma vida melhor.

Tudo é bem pensado para que sua realização transcorra dentro da normalidade, sem contratempos. Como o percurso das romarias geralmente é longo – já foram realizadas romarias com até oito quilômetros de caminhada, então, é sempre pedido nas missas que antecedem o evento para que todos levem água, especialmente porque a cidade de Rondonópolis é demasiadamente quente.

Os organizadores desse evento também têm a preocupação com o cansaço dos participantes; que eles possam desanimar e deixar de fazer a caminhada. Nesse sentido, como participante regular nas romarias, tenho observado que durante a caminhada há sempre alguém falando palavras de incentivo, tais como: “Vocês estão alegres? Nós queremos que vocês se alegrem ainda mais! Vocês estão felizes? Nós desejamos que essa felicidade permaneça durante toda a celebração e durante toda nossa vida”!

É perceptível que as pessoas se sentem revigoradas com essas palavras, seguindo adiante.

Os mártires são lembrados o tempo todo, tendo seus nomes ditos e repetidos. Sempre é lembrado que a América Latina toda é um altar vivo de mártires, que levaram até às últimas conseqüências a sua existência.

Lembro-me de Dom Juventino Kestering dizer durante uma Romaria que mártires não são apenas aqueles que morreram, mas que mártires são também os  pobres, pois muitos estão sofrendo pela discriminação, pela falta de moradia, pela falta de alimentação, pela falta de saúde, pela injustiça na distribuição de terra. E que todos os participantes deveriam trazer um pouco desse conceito de martírio para o seu cotidiano, ao invés de se fazerem de cegos para não verem seus  irmãos passando necessidades, clamando por pão e moradia; irmãos mendigando pelas ruas da cidade, crianças jogadas ao relento. Olham esses problemas existentes na sociedade, dizia ele, com olhos de cegos.

Outro aspecto que pude constatar foi que para saber quem pertence a determinada paróquia, sempre há o uso de uma forma de identificação, tais como cor das bandeirolas ou  mensagens colocadas nas bandeirolas, como na Romaria do ano de hum mil novecentos e noventa e quatro (1994), quando a paróquia Nossa Senhora Aparecida representou a Igualdade; a paróquia Santa Cruz representou o Amor; a paróquia Sagrado Coração de Jesus representou a Dignidade; a paróquia Bom Pastor representou a Solidariedade; a paróquia São José Operário representou a Responsabilidade; a paróquia São Pedro Apóstolo representou a Fraternidade; a paróquia Bom Jesus representou a União; a paróquia Nossa Senhora de Fátima representou a Verdade; a paróquia de Guiratinga representou a Esperança; a paróquia do Conjunto São José representou a Nova Vida etc.

A Diocese de Rondonópolis tem procurado sempre envolver todas as pessoas, de maneira organizada, em torno de suas paróquias, levando o maior número possível de participantes, que já chegou a mais de cinco mil pessoas numa única Romaria.

O número de caminhantes chama a atenção das pessoas por onde passam as romarias, pois aquelas que não participam, via de regra,  ficam nas portas das casas,  nas janelas, nas calçadas, nas praças etc.,  a olhar o cortejo que passa, conseguindo as romarias assim, chamarem também a atenção das pessoas que apenas as assitem, para o martírio. A foto nº5 abaixo, dá-nos bem a dimensão do número de caminhantes.

 

Figura 5: Caminhantes da Romaria

Fonte: Gonçalves, Maria Aparecida

 

Segundo pesquisas que fiz  em documentos da  Diocese, a Igreja Católica teria nascido sob o signo do martírio de Jesus, e cresceu regada pelo sangue de tantos mártires, que souberam manter firme sua fé em Jesus, na esperança de que a vida vença a morte.

Segundo o Padre Giovane Pereira de Melo,

São cerca de 150 os missionários católicos, entre sacerdote e religiosos, mortos nos últimos dez anos, numa média de dois por mês. Este número, que não considera catequistas leigos, foi anunciado num martirológico publicado pelas Pontifícias Obras Missionárias. Os assassinatos aconteceram em terras consideradas ainda de missão, como África, Ásia, e também na América Latina, em países que vivem em constante tensão social.[52]

Nas romarias, muitos são os mártires lembrados e homenageados, tais como Dom Oscar Romero; Margarida Maria Alves; Pe. Josimo, Pe. Ezequiel Ramin; Irmão Vicente Cañas, Pe. João Bosco Burnier; Marçal Tupã-h; Rodolfo Lunkenbein; Galdino Jesus dos Santos; os índios Simão e Sepé Tiaraju; Santos Dias da Silva; Francisco Alves Mendes Filho (Chico Mendes); Nativo da Natividade de Oliveira; Dorothy Stang; Dorcelina de Oliveira Folador; Tito Alencar Lima; Silvia Maribel Arriola;  Nestor Paz Zamora.

A Igreja Católica está construída desde o seu início sobre a fé dos mártires, que teve Jesus Cristo como seu maior exemplo de martírio, por  defender seus irmãos injustiçados. Daí, os seus seguidores que também tinham - e que até hoje vem tendo, a mesma consciência de justiça que Jesus pregava.

Mas é importante citar aqui o que foi lembrado de maneira coerente, pelo Padre Giovane, e que até hoje é cobrado da Igreja Católica:

Infelizmente há também os mártires feitos pela própria Igreja. Quantas vezes na história a própria Igreja dos mártires se esqueceu de seu passado e pôs-se, ela, a instituição salvadora, a fazer mártires em todo o seu caminho? Quantas pessoas não foram sacrificadas só porque a Igreja não se esforçou para entendê-las? Quantas missões não massacraram grupos, povos, continentes inteiros por causa de sua cultura? [53]

Exemplo do que é dito pelo Padre Giovane, foi a Inquisição, que perseguiu, prendeu, julgou e condenou a mortes brutais pessoas que manifestassem qualquer sinal de desaprovação aos atos e atrocidades cometidos pela Igreja Católica, estas que eram consideradas hereges. Aviltamentos foram cometidos contra sociedades indígenas, contra os negros, enfim, uma história pela qual ainda hoje a Igreja Católica tem precisado prestar contas.

Hoje, muitos daqueles mártires do passado são reconhecidos pela Igreja Católica, como São Sebastião, Santa Luzia, Joana d'Arc e outros, o que tem acontecido mais pela pressão dos devotos, do que necessariamente por concessão da Igreja.

É verdade que a Igreja Católica, com o passar dos anos, vem renovando-se através da fé, da ação e pelo testemunho dos mártires, que dão lições de fé e crença em Deus. E é por meio dessa fé que muitos avaliam que as pessoas se lançam à luta para buscar a sua realização própria e também a de seus irmãos rejeitados pela sociedade.

A Igreja Católica hoje parece estar engajada na luta para intervir na diferença social gritante que existe. Digo parece, até porque a Igreja Católica apresenta no seu seio também diferenças, divergências, fissuras. Ela não é homogênea, como de resto não são homogêneas outras instituições e entidades. Parece-me que nem poderia ser diferente, pois a sociedade humana é toda perpassada pelas diferenças, pela diversidade, o que nem sempre tem sido levado em consideração.

Em Rondonópolis, a Igreja Católica por meio da Romaria dos Mártires tem buscado através da manifestação do martírio, levar os seus fiéis a refletirem sobre o que acontece na sociedade; refletirem sua ação junto aos oprimidos e excluídos. Segundo documentos da Diocese que consultei, é por isso que a Romaria dos Mártires sempre tem seu calendário programado para a época da Quaresma, que é um momento de reflexões, de busca espiritual, de demonstração de fé.

A caminhada feita pelos participantes das romarias é marcada, sobretudo, pela memória dos Mártires, que ao longo da história, desde a Igreja primitiva até a Igreja contemporânea, têm atuado como testemunhas de Jesus Cristo, solidários ao seu projeto de libertação e salvação, a partir dos pobres, dos doentes, marginalizados e oprimidos, dos encarcerados, que estão ali por terem sido relegados pela sociedade; dos sofredores, dos indígenas, dos negros, que são ainda grandemente rejeitados pela sociedade branca; as prostitutas, os bêbados, os viciados em drogas, os menores de rua, os favelados, enfim, dos humilhados de todos os tempos e lugares, pessoas essas que para a doutrina católica devem ser os primeiros destinatários da revelação, do amor, da predileção e da misericórdia divina.

A Romaria dos Mártires, localmente quer uma conscientização da sociedade rondonopolitana sobre os problemas gerados pela opressão e exclusão nesta cidade; que as pessoas deixem, ainda que seja um pouco, de lado, o prestígio social e o egoísmo de pensar somente em si mesmas, pois o homem em geral vem através dos séculos, em busca de uma direção, tentando aprender e apreender sem fraquejar, mas sem o sofrimento das dores, sem levar muito em consideração o próximo.

Mas, felizmente, já se nota a humanização do homem, que busca, por exemplo, entre outras alternativas, na religião, o seu compromisso com o sentido de fraternidade, liberdade e igualdade. Daí crescer a vontade de ajudar alguém, seja pela piedade ou pela dor da consciência. O que importa é a atitude e a ação, não importa se ela vem da piedade ou por peso de consciência; da consciência política ou da fé religiosa: importante é que essa ajuda ou que as mudanças necessárias ocorram.

Em busca de saídas aos problemas que se vive em sociedade, estão engajadas também outras religiões, outras pessoas, que não só os católicos, como disse o Professor Ivanildo:

Nós temos em Rondonópolis pelos menos duas ou três igrejas evangélicas tradicionais, as quais são membros da Igreja Cristã do Brasil e que participam juntas, como exemplo a Igreja Luterana. E outros irmãos não católicos.

A cada ano a Diocese de Rondonópolis tem apresentado nomes de novos mártires, como na Romaria do dia 23 de março, de dois mil e três (2003), que incluiu os nomes do juiz de Direito, Antônio Machado Dias, assassinado em Presidente Prudente-SP, por ter sido rigoroso com os integrantes do crime organizado; e do jornalista Tim Lopes, assassinado por denunciar a ação de traficantes nos morros do Rio de Janeiro-RJ.

A Igreja Católica tem criado organismos de solidariedade em favor dos que sofrem; encoraja seus membros a suportar as perseguições, às vezes até à morte, como testemunho de sua missão anunciando o Reino e denunciando a injustiça.

Nestes anos todos há centenas de mortes que não foram registradas, mortes essas, de trabalhadores, de índios, de negros, de escravos nas fazendas, de peões, de garimpeiros, de crianças e de mulheres, que morreram pela fome, doença, abandono, pela exclusão sofrida, morreram em busca de terra para manter a si e a sua família, enfim, morreram em busca de uma nova sociedade.

Ao alcance dos olhos das romarias estão os mendigos, que pedem da sociedade um pouco de atenção e solidariedade; os moradores de rua, que não têm para onde ir e tantas vezes causam pavor e indiferença; os idosos, muitos abandonados pela família e considerados improdutivos pela sociedade; os prostitutos e prostitutas, rejeitados pela sociedade mas explorados para o lucro e o prazer pelo mercado do sexo; os encarcerados, vítimas muitas vezes de injustiças, discriminação e de um sistema penitenciário que não lhes possibilita recuperação e reintegração na sociedade; os deficientes, que além de serem rejeitados por membros da sociedade e discriminados no mundo do trabalho, muitas vezes são rejeitados pela própria família; os alcoolizados, que buscam na bebida a fuga dos problemas causados pelo desemprego, pelos desajustes familiares ou pela doença etc.

Vivemos em uma sociedade que vive enormemente em função dos ideais do poder, do prazer, e o mártir é um exemplo do que significa realmente amar.  Para a Igreja Católica, Jesus Cristo é o único que está presente no meio de nós e que é capaz de engendrar um amor mais forte que os instintos, que a morte e todos os poderes econômicos e políticos. Em Mt 25. 31-40, pode-se ler “O Grande julgamento”:

31 Quando, pois vier o Filho do homem na sua glória, e todos os anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória;

32 e diante dele serão reunidas todas as nações; e ele separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos;

33 e porá as ovelhas à sua direita, mas os cabritos à esquerda.

34 Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai. Possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo;

35 porque tive fome, e me destes de comer; tive sede, e me destes de beber; era forasteiro, e me acolhestes;

36 estava nu, e me vestistes; adoeci, e me visitastes; estava na prisão e fostes ver-me.

37 Então os justos lhe perguntarão: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? ou com sede, e te demos de beber?

38 Quando te vimos forasteiro, e te acolhemos? ou nu, e te vestimos?

39 Quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos visitar-te?

40 E responder-lhes-á o Rei: Em verdade vos digo que, sempre que o fizestes a um destes meus irmãos, mesmo dos mais pequeninos, a mim o fizestes.

41 Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o Diabo e seus anjos;

42 porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber;

43 era forasteiro, e não me acolhestes; estava nu, e não me vestistes; enfermo, e na prisão, e não me visitastes.

44 Então também estes perguntarão: Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede, ou forasteiro, ou nu, ou enfermo, ou na prisão, e não te servimos?

45 Ao que lhes responderá: Em verdade vos digo que, sempre que o deixaste de fazer a um destes mais pequeninos, deixastes de o fazer a mim.

46 E irão eles para o castigo eterno, mas os justos para a vida eterna.[54]

Por meio dessa parábola, Jesus mostrou que abraçou apaixonadamente a causa em favor dos excluídos da sociedade. Por isso, como fala a Palavra, o que se faz aos oprimidos, excluídos e abandonados pela sociedade, é a Jesus que se está fazendo.

Muitos seguidores de Jesus formaram comunidades a partir dos excluídos, como os pobres e os escravos. Assim, como os mártires, todos também são convidados a acolher os marginalizados da sociedade, reintegrando-os e dando-lhes nela um lugar. Além do que, segundo a doutrina da Igreja Católica, no fim da vida todos serão julgados por aquilo que fizeram ou que deixaram de fazer aos oprimidos e excluídos.

Nesse sentido, avalio que a Diocese de Rondonópolis, em eventos como a Romaria dos Mártires, vem buscando contribuir com a construção de uma maior consciência das pessoas, para que essas não tenham medo de lutar pelo que é certo, porque é preciso encontrar meios e caminhos para uma melhor redistribuição da riqueza na sociedade, se é que se quer tê-la mais justa e  igualitária.

Durante a pesquisa que fiz, gostaria de acrescentar ainda, vi que não só a Igreja Católica regional, ou melhor dizendo, nacional, está engajada em manter viva a memória dos mártires, pois também há uma preocupação do Papa, para que a Igreja Católica nunca se esqueça da memória daqueles que sofreram o martírio, testemunho importante e inesquecível. Seus discursos têm tido esse tom.  

Dom Osório dizia que

A exemplo de Jesus Cristo, o sangue dos mártires que regaram a terra se transformaram em semente de vida e esperança para milhares de irmãos e irmãs. No gesto de repartir a semente queremos caminhar para a Páscoa, passando pela morte do egoísmo, da indiferença, do preconceito e do comodismo e ressuscitar com Cristo, para a vida nova da esperança, da justiça e da fraternidade[55].

Pude constatar, por meio de minha pesquisa, que a Diocese de Rondonópolis tem aproximado-se bastante do alcance de seus objetivos.  Isso  fica visível na fala do jovem Edér Bruno dos Santos, quando me disse que das romarias que tem participado ele leva para a sua vida

Uma emoção muito forte […] que nóis, como estamos caminhando mais pra frente, pra Jesus, né? cada vez mais procurando a fé […] que a gente tem muita fé em Jesus Cristo, em Deus e, também mostrando pra sociedade, a humanidade que a gente seja, que tem que ser, e preocupar com o próximo na sociedade, que a gente tem muita sociedade desperdiçada, que não procura Deus, mas leva a procurar Deus. 

Portanto, das romarias - vividas também como sentimentos, como brota na fala de Éder, ressalta-se a fé religiosa, que propaga e amplia, e a preocupação com a humanização da sociedade, tornando-a mais fraterna e solidária. O que avalio como relevante e merecedor de respeito por todos. Digo issso, porque é bastante sentido em ambientes como a Universidade, espaço em que estou me formando, preconceito em relação à religiosidade por parte de alguns intelectuais, que parecem-me, não conseguem dimensionar o sentido sócio-político presente em muitas de suas manifestações. 

 


UNIDADE VII

 

MÁRTIRES

 

“[mártires] foi aquelas pessoas que morreram a favor dos irmãos, em beneficio à alguém”

(Ana Lúcia de Larceda)(*)

 

Figura 6: Os Mártires

Fonte: Itamar Eduardo Gonçalves de Oliveira.

 

Esta unidade traz um pouco da biografia de alguns mártires, que a partir da Romaria dos Mártires tiveram uma oportunidade a mais para deixar o anonimato e se tornar um pouco mais conhecidos.

Segundo alguns textos que li, os mártires da Bíblia são aqueles que deram suas vidas em defesa da Palavra e dos ensinamentos de Jesus Cristo. Já hoje, são considerados mártires aqueles que dão suas vidas para libertar as pessoas que sofrem ao buscar dignidade de vida para si e para sua família, pois a regra geral do sistema capitalista é que quem tem, sempre terá mais, e quem não tem vai continuar sempre assim, porque não se esforça para fazer diferente. Daí, quando surgem esses homens e mulheres que têm a coragem de mostrar suas caras e exigir a partilha de bens que são socialmente produzidos, ou então que foram disponibilizados pela própria natureza, são perseguidos, liquidados, massacrados, além de outros tipos de atrocidades que acabam enfrentando. Mas isso não intimida essas pessoas de coragem, pois elas vão até o último instante de suas vidas perseguindo o seu propósito.

Na visão de setores da Igreja Católica, para terem essa força muitos dos mártires têm Deus com eles, que os guia e os conforta com suas palavras. Sabem que nunca estão sozinhos e sabem que por meio da doação de suas vidas outros, pelo exemplo deixado, darão continuidade a essa luta. E que lá no futuro, a partir do conjunto desses esforços a favor de um novo tipo de sociedade, poderá acontecer a tão esperada libertação dos oprimidos e não haverá mais opressão e exclusão.

Para a Igreja Católica, o mártir maior é Jesus Cristo. Com ele estão os mártires da fé cristã, homens e mulheres, que fazem parte do mesmo grupo ou comunidade. Estão aqueles que apóiam e se solidarizam com a mesma causa e, conscientemente, assumem na sua vida a luta em busca de uma melhor distribuição de renda e de terra para os pobres, enfim, que lutam por mais justiça social. Essas pessoas enfrentam o martírio por causa do seu engajamento explícito e concreto em projetos sociais que nem sempre - ou nunca - são de interesse das elites políticas e econômicas.

O Professor Ivanildo em entrevista que me concedeu, disse-me que em uma entrevista dada por Dom Osório W. Stoffel, este teria assim definido o que é um mártir:

Não é preciso que a pessoa perca sua vida numa luta específica para ser um mártir. A mãe que tem um bebê de colo e por ele faz o melhor de sua vida, é uma mártir [mas] nem toda mãe é uma mártir, mas uma mãe que não se alimenta por alguns dias e ainda assim consegue dar mamar para o seu filho, é uma mártir.[56]

A seguir, elenco os mártires que vêm sendo lembrados e reverenciados durante a realização da Romaria dos Mártires, nos vários anos de sua história aqui em Rondonópolis – MT.

 

PADRE JOÃO BOSCO PENIDO BURNIER

 

Nasceu no dia onze de junho, de hum mil novecentos e dezessete (1917), em Juiz de Fora, MG. Missionário, ele atuou entre os índios na Prelazia de Diamantino-MT. Foi morto no dia dez de outubro, de hum mil novecentos e setenta e seis (1976), quando estava com Dom Pedro Casaldáliga, na cidade de Ribeirão Bonito, perto de Barra do Garças. Eles foram socorrer duas mulheres camponesas, uma delas grávida, que estavam sendo torturadas na delegacia. Diz-se que os gritos delas eram ouvidos por toda a cidade.

Quando o Pe. João Bosco foi interceder por elas, foi agredido, levando uma coronhada e um tiro fatal dado por um policial.

Pe. João Bosco agonizou por muitas horas, oferecendo a sua vida pelos índios e pelo povo. Invocando a Jesus, ele teria dito a Dom Pedro: “Dom Pedro acabamos nossa tarefa”.

 

MARGARIDA MARIA ALVES

 

Nasceu em cinco de agosto, de hum mil novecentos e quarenta e três (1943), em Alagoa Grande, na Paraíba. Foi a filha mais nova de nove irmãos. No entanto, isso não foi impedimento para que fosse uma das primeiras mulheres a lutar pelos direitos daqueles que até hoje trabalham na terra. O contato permanente com o setor latifundiário, que começou desde muito cedo, devido à necessidade da manutenção da família, estimulou seus desejos para lutar pelo trabalhador rural. Pelo fato de ser católica, Margarida teve uma grande influência do Padre Geraldo, para ingressar no Sindicato Rural de Alagoa Grande, na Paraíba. Caracterizada pela constância e disposição do trabalho, chegou a ser tesoureira do mesmo e, em hum mil novecentos e setenta e três (1973), foi eleita presidenta, sucessivamente, até mil novecentos e oitenta e dois (1982).

A sindicalista lutava pela defesa dos direitos do homem do campo; pelo décimo terceiro salário; registro em carteira; jornada de oito horas e férias obrigatórias. Foi uma das fundadoras do Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural, cuja finalidade é, até hoje, contribuir no processo de construção de um modelo de desenvolvimento rural e urbano sustentável, a partir do fortalecimento da agricultura familiar. Durante seus doze anos dentro do Sindicato foram movidas mais de seiscentas ações trabalhistas contra os usineiros e senhores de engenho da região da Paraíba.

Em seus anos de luta, nunca se registrou, na justiça, uma perda de alguma questão do trabalho a favor do trabalhador rural. A sua luta era em prol dos trabalhadores, motivo pelo qual sofreu várias ameaças e atentados à sua integridade física. Como resultado de sua liderança, aproximadamente setenta e três reclamações trabalhistas contra engenhos e contra a Usina Tanques foram movidas, o que, no período ditatorial, produziu uma forte repercussão e atraiu o ódio de latifundiários locais, que chegaram a ameaçá-la e intimidá-la. Margarida, com sua personalidade forte e incansável, não se deixou abater por esses efeitos, pelo contrário, tornava-os públicos e fazia questão de respondê-los.

Margarida morreu assassinada, em doze de agosto, de hum mil novecentos e oitenta e três (1983), defendendo os ideais e direitos dos trabalhadores rurais. Para ela a vida tinha um só objetivo, e a frase que sempre fará referência a ela diz: "É melhor morrer na luta do que morrer de fome". Tinha quarenta 40 anos de idade, leiga e foi Presidente de Sindicato dos Trabalhadores, membro da Comissão Pastoral da Terra – CPT, da Diocese de Guarabira na Paraíba.

Enquanto brincava com seu filho, o assassino lhe apareceu na frente e disparou-lhe no rosto uma carga de pregos e chumbo grosso. Severino Cassimiro, seu esposo, que estava a poucos metros, assistiu petrificado a tragédia. Quando avisada de que sua vida corria perigo, ela simplesmente respondia: “Da luta eu não fujo”.

 

SANTOS DIAS DA SILVA

 

Nasceu em vinte e dois de fevereiro, de hum mil novecentos e quarenta e dois, na fazenda Paraíso, município de Terra Roxa, no Estado de São Paulo.

Seus pais, Jesus Dias da Silva e Laura Amâncio Vieira, tinham mais sete filhos, além de Santos, o primeiro braço no potencial de trabalho da família. Durante quarenta anos sua família trabalhou como meeira em diversas fazendas na mesma região.

Católico, desde a adolescência participava das atividades religiosas em sua terra natal, entre elas a Legião de Maria. A movimentação social da década de 1960 influenciou sua atitude e de muitos outros trabalhadores rurais. Entre hum mil novecentos e sessenta e hum mil novecentos e setenta, junto com outros empregados da Fazenda Guanabara, participou de um movimento por melhores condições de trabalho e salário. Por isso, sua família foi expulsa da colônia em que morava e teve de morar na cidade, numa casa alugada.

Os pais e os irmãos continuaram a trabalhar na roça, como bóias-frias. Santo resolveu procurar outras oportunidades e foi morar em Santo Amaro, na região sul da capital de São Paulo, área de grande concentração de indústrias. Ali, conseguiu trabalho como ajudante geral na Metal Leve, empresa de componentes metalúrgicos. Participou também das Comunidades Eclesiais de Base - CEBs, das quais foi um esteio propagador

No primeiro dia da paralisação, ocorrida em vinte e oito de outubro, de hum mil novecentos e setenta e nove (1997), as subsedes do Sindicato, abertas para abrigar os comandos de greve, foram invadidas pela Polícia Militar, que prendeu mais de cento e trinta pessoas. Sem o apoio do sindicato e com a intensa repressão policial sobre sua ação, os metalúrgicos passaram a se reunir na Capela do Socorro, sendo a Zona Sul a região de maior concentração da categoria. No dia trinta, Santo Dias, como parte do comando de greve, saiu da Capela do Socorro, para engrossar um piquete na frente da fábrica Sylvânia e discutir com os operários que entravam no turno das quatorze horas.

No dia trinta de outubro, de hum mil novecentos e setenta e nove (1997), viaturas da PM chegaram, e Santo Dias tentou dialogar com os policiais para libertar companheiros presos. A polícia agiu com brutalidade e o PM Herculano Leonel atirou em Santo Dias pelas costas. Ele foi levado pelos policiais para o Pronto Socorro de Santo Amaro, mas já estava morto. O corpo de Santo Dias só não “desapareceu” por conta da coragem de Ana Maria, sua esposa. Ela entrou no carro que transportava seu corpo para o Instituto Médico Legal. Apesar de abalada emocionalmente e pressionada pelos policiais, a descer, não cedeu.

Divulgada a notícia de sua morte pelos vários meios de comunicação, seu corpo seguiu para o velório na Igreja da Consolação. No dia trinta e um de outubro, trinta mil pessoas saíram às ruas da capital para acompanhar o enterro e protestar contra a morte do líder operário, que lutava pelo livre direito de associação sindical e de greve, e contra a ditadura.

 

SILVIA MARIBEL ARRIOLA

 

Mulher de sorriso longo, religiosa, salvadorenha de trinta anos, era pequena, de aparência frágil, mas forte quando se tratava de encontrar uma solução, ainda que arriscada, em situações perigosas.

Ela morreu em um acampamento destruído pela Guarda Nacional, ao Oeste de San Salvador.

Esta mulher salvadorenha, juntamente com outras companheiras, tornou-se religiosa do povo a serviço das maiorias pobres do seu país, uma vocação que abraçou com muito amor e levou até às últimas conseqüências.

 

NESTOR PAZ ZAMORA

 

Filho de um general boliviano, Nestor ingressou num seminário e estudou teologia. Desde cedo, ligou-se às CEBs. Mais tarde, como estudante de medicina, incorporou-se à Guerrilha de Teoponte (cidade de Teoponte), na Bolívia.

A Bolívia é um país essencialmente cristão, em que nem todos estão satisfeitos com a simples participação em cultos. Muitos se engajam em lutas por transformação social e possibilitam mudanças históricas.

Nestor foi um militante da Igreja da Libertação na Bolívia. Toda a sua vivência de cristão militante foi a favor de seu povo, lutando por uma terra nova, onde o amor fosse a lei fundamental. Morreu de fome, no dia oito de outubro, de mil novecentos e setenta (1970).

 

TITO ALENCAR LIMA

 

Nascido em Fortaleza – CE, no dia quatorze setembro, de hum mil novecentos e quarenta e cinco (1940), filho de Ildefonso Rodrigues de Lima e Laura Alencar Lima.

Desejando uma vivência evangélica mais radical e a serviço dos demais, escolheu a ordem dominicana para nela consagrar-se como religioso.

Estudou em Fortaleza com os padres jesuítas. Foi dirigente regional e nacional da JEC (Juventude Estudantil Católica). Em hum mil novecentos e sessenta e cinco (1965), ingressou na Ordem dos Dominicanos, sendo ordenado sacerdote em mil novecentos e sessenta e sete (1967); e também foi aluno de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP).

Militante da Ação Estudantil Católica, foi seu coordenador para o Nordeste. Foi preso em hum mil novecentos e sessenta e oito (1968), sob a acusação de ter alugado o sítio onde se realizou o Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), em lbiúna - SP.

Foi preso novamente em quatro de novembro, de hum mil novecentos e sessenta e nove (1969), em companhia de outros padres dominicanos, acusados de terem ligações com a Ação Libertadora Nacional (ALN), e Carlos Marighela.

Frei Tito foi torturado durante quarenta dias pela equipe do delegado Sérgio Fleury, e transferido depois para o Presídio Tiradentes, onde permaneceu até dia dezessete de dezembro. Nesse dia, foi levado para a sede da Operação Bandeirantes - Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa (DOI-CODI/SP), quando o Capitão Maurício Lopes Lima lhe disse: "Agora você vai conhecer a sucursal do inferno".

E foi o que ocorreu. Torturado durante dois dias, pendurado no pau-de-arara, recebendo choques elétricos na cabeça, órgãos genitais, nos pés, mãos, ouvidos, com socos, pauladas, "telefones", palmatórias, "corredor polonês", "cadeira do dragão", queimaduras com cigarros, tudo acompanhado de ameaças e insultos. A certa altura, o Capitão Albernaz lhe ordenou que abrisse a boca para receber a hóstia sagrada, introduzindo-lhe um fio elétrico que queimou-lhe a boca a ponto de impedi-lo de falar.

Frei Tito foi deixado durante toda uma noite no pau-de-arara e, no dia seguinte, tentou o suicídio com uma gilete, sendo conduzido às pressas para o Hospital do Exército, do Cambuci, onde ficou cerca de uma semana sob tratamento médico sem, contudo, deixar de ser submetido a tortura psicológica constante.

Banido do país, em treze de janeiro, de hum mil novecentos e setenta e um (1971), com outros prisioneiros políticos, em troca da liberdade de um embaixador da Alemanha no Brasil, viajou para o Chile e depois para a Itália e França.

Após algum tempo, instalou-se na comunidade dominicana de Arbresle, tentando desesperadamente lutar contra os crescentes tormentos de sua mente, abalada profundamente pela tortura. Já no exílio, foi condenado pela 2ª Auditoria a uma pena de um ano e meio de reclusão, em vinte e três de fevereiro, de hum mil novecentos e noventa e três (1973).

No dia sete de agosto, de hum mil novecentos e noventa e quatro (1974), com trinta e um anos de idade, Frei Tito se enforcou, pendurando-se em uma árvore. Foi enterrado no Cemitério Dominicano de Sainte Marie de la Tourette, próximo a Lyon, na França. Em vinte e cinco de março, de hum mil novecentos e oitenta e três (1983), seus restos mortais foram trasladados para o Brasil, acolhidos solenemente na Catedral da Sé, em São Paulo, com missa rezada por D. Paulo Evaristo Arns, tendo sido enterrado no jazigo de sua família, em vinte e seis de março do mesmo ano, em Fortaleza-CE.

 

PE. EZEQUIEL RAMIN

 

Tinha trinta e dois anos. Nasceu na Itália, em hum mil novecentos e cinqüenta e três (1953). Foi missionário na diocese de Ji-Paraná, Rondônia. Membro da Congregação dos Combonianos, veio para o Brasil em meados de hum mil novecentos e oitenta e três (1983). Assumiu a causa dos trabalhadores sem-terra e dos índios. Ganhou a confiança dos Suruí, que iam procurá-lo para expor os problemas da aldeia.

Quando, em hum mil novecentos e oitenta quatro (1984), o Pe. Ezequiel chegou a Cacoal, encontrou uma caminhada já feita. Havia comunidades fortes e lideranças bem conscientes de suas responsabilidades. Não teve dificuldade de se inserir. A idade, pouco mais de trinta anos, dava-lhe o entusiasmo que o desafio exigia. Além do mais, Ezequiel tinha uma sensibilidade, por certas questões, superior a de tantos outros padres. Foi quando, em uma região entre Mato Grosso e Rondônia, na área pastoral de Cacoal, apareceu uma placa: “Fazenda Catuva, proibida a entrada”.

Coisa estranha: duzentas e cinqüenta famílias trabalhavam aquelas terras há mais de dois anos, convivendo com os únicos possíveis donos, os índios Suruí, com os quais, porém, as famílias tinham conseguido estabelecer relações de respeito e amizade. Porém, apareceu a placa e, com a placa, uma cerca e uma porteira; e gente armada, do outro lado, inibindo qualquer tentativa de aproximação. Os donos? Dois irmãos: Omar e Osmar, fazendeiros. No papel, proprietários de 2.499 hectares. Na prática, tentando abocanhar 50 mil hectares (alguém falava até em 100 mil); passando por cima dos índios, das famílias de posseiros e de suas roças.

A questão chegou à paróquia. Pe. Ezequiel tinha chegado há pouco tempo. Tinha demonstrado sensibilidade pelos problemas do povo. Havia coisas que o incomodavam profundamente: as desigualdades sociais, sobretudo; os muitos que não têm nada e os poucos que têm tudo; as injustiças; a arrogância de quem tenta se impor pelas armas ou pela manipulação das leis. Em várias oportunidades ele tinha tocado nesses assuntos, inclusive nas homilias e celebrações. Era de seu estilo trazer a Palavra de Deus para a realidade das pessoas. O povo ouvia. Alguns simpatizavam, outros o criticavam. Uns poucos manifestavam publicamente seu desapontamento, tanto que o padre passou a gravar suas homilias, para que suas palavras não fossem distorcidas e usadas como armas contra ele.

No dia vinte e quatro de julho, de hum mil novecentos e oitenta e cinco (1985), padre Ezequiel foi ao encontro dos posseiros na Fazenda Catuva, no município de Aripuanã. Na volta, na saída de uma curva, o ataque. Sete homens armados (jagunços de fazendeiros da região), em posição de tiro, esperavam. Dois deles abriram fogo, a uns trinta metros de distância. Estava selado o seu fim.

 

NATIVO DA NATIVIDADE DE OLIVEIRA

 

Presidente do Sindicato dos Lavradores Rurais de Carmo do Rio Verde – Goiás. Foi assassinado em vinte e três de outubro, de hum mil novecentos e oitenta e cinco (1985).

 

DOM OSCAR ARNULFO ROMERO Y GADAMEZ

 

Nasceu em quinze de agosto, de hum mil novecentos e dezessete (1917), em Ciudad Barrios, em El Salvador. Sua família era numerosa e pobre. Quando criança, sua saúde inspirava cuidados. Com apenas treze anos entrou no seminário. Foi para Roma completar o curso de Teologia, com vinte anos. Ordenou-se sacerdote em hum mil novecentos e quarenta e três (1943).

Retornou a El Salvador, na função de pároco. Era um sacerdote generoso e atuante: visitava os doentes, lecionava religião nas escolas, foi capelão do presídio; os pobres carentes faziam fila na porta de sua casa paroquial, pedindo e recebendo ajuda.

Durante vinte e seis anos, na função de vigário, padre Oscar Romero conheceu a miséria profunda que assolava seu pequeno país. Em hum mil novecentos e setenta e sete (1977), foi nomeado Arcebispo de El Salvador. No dia vinte e quatro de março, de hum mil novecentos e oitenta (1980), Dom Romero foi fuzilado em meio aos doentes de câncer e enfermeiros, enquanto celebrava uma missa na capela do Hospital da Divina Providência, na capital de El Salvador.

 

DORCELINA DE OLIVEIRA FOLADOR

 

Nasceu em vinte e sete de julho, de hum mil novecentos e sessenta e três (1963), em Guaporema, estado do Paraná (PR). Chegou a Mundo Novo – Mato Grosso do Sul (MS), em mil novecentos e setenta e seis (1976), com onze anos de idade. Iniciou sua atuação na Pastoral da Juventude no ano de mil novecentos e oitenta (1980). Em mil novecentos e oitenta e sete (1987), ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores, candidatando-se no ano de hum mil novecentos e oitenta e oito (1988), à vereadora.

Professora, poeta, artista plástica, em hum mil novecentos e oitenta e nove (1989) começou a colaborar com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), chegando à direção estadual do Movimento e atuando como repórter popular do seu Jornal. Ajudou a fundar também a Associação Mundonovense dos Portadores de Deficiência Física (AMPDF).

Depois de novamente candidatar-se a vereadora em hum mil novecentos e noventa (1992), e a Deputada Estadual em hum mil novecentos e noventa e cinco (1995), foi eleita prefeita de Mundo Novo para o mandato de hum mil novecentos e noventa e sete (1997), a dois mil (2000). Seu mandato foi interrompido em trinta de outubro, de hum mil novecentos e noventa e nove (1999), às vinte e três horas, quando foi assassinada na varanda de sua casa.

 

FRANCISCO ALVES MENDES FILHO

 

Seringueiro desde criança, dedicou praticamente toda a sua vida em defesa dos trabalhadores e povos da floresta. Participou da fundação dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais de Brasiléia e Xapuri, além da fundação do Partido dos Trabalhadores do Acre, e do Conselho Nacional dos Seringueiros.

Reuniu em sua luta o trabalho sindical, a defesa da floresta e a militância partidária, tendo sido o seu trabalho reconhecido internacionalmente, sendo várias vezes premiado, inclusive pela Organização das Nações Unidas (ONU), que o distinguiu como um dos mais importantes defensores da natureza, no ano de hum mil novecentos e oitenta e sete (1987).

Através de sua luta pela implantação das reservas extrativistas, Chico combinava a defesa da floresta com a reforma agrária reivindicada pelos seringueiros, contrariando grandes interesses, principalmente os interesses de latifundiários e da União Democrática Ruralista (UDR).

Em vinte e dois de dezembro, de hum mil novecentos e oitenta e oito (1988), aos quarenta e quatro anos de idade, Chico Mendes foi assassinado na porta de sua casa.

 

MARÇAL TUPÃ-i

 

Índio Guarani. Nasceu em hum mil novecentos e vinte e quatro (1924), e foi assassinado na aldeia de Campestre, município de Antonio João, Mato Grosso do Sul, em vinte e cinco de novembro de hum mil novecentos e oitenta e três (1983), aos cinqüenta e nove anos de idade.

Marçal, cinco dias antes de ser morto, havia recusado uma oferta de dinheiro para facilitar a retirada dos índios Kaiowá, da área Pirakuá.

Em julho de hum mil novecentos e oitenta (1980), leu uma mensagem para o Papa João Paulo II, em sua primeira visita ao Brasil, no Amazonas. Na carta falava da tristeza sentida pelos índios, “pela morte de líderes assassinados friamente por aqueles que tomam o nosso chão”.

 

GALDINO JESUS DOS SANTOS

 

Liderança do povo Pataxó e  Hã-Hã-Hãe, nasceu em hum mil novecentos e noventa e dois (1952), na Bahia.  Na madrugada do dia vinte de abril, de hum mil novecentos e noventa e sete (1997), Galdino, quarenta anos de idade, dormia sob um abrigo de usuários de ônibus da 703/704 - via W-3 Sul, em Brasília – DF, quando foi alvo de um dos crimes mais bárbaros e torpes de que se teve notícia na capital federal e no País.

Passageiros de veículos que transitavam pelo local, com muito custo conseguiram apagar o fogo que lhe ardia em todo o corpo, Galdino deu entrada agonizante mas ainda consciente, no Hospital Regional da Asa Norte. Completamente cego devido às queimaduras nas córneas, conseguiu se identificar para a equipe médica e indicar a localização de seus companheiros. Antes de entrar em coma, perguntou repetidas vezes: “POR QUE FIZERAM ISSO COMIGO?” Galdino achava que havia sido atingido por um coquetel molotov.

Para todos, o choque maior veio poucas horas depois, com a descoberta feita pela polícia: o fogo havia sido ateado às suas vestes por um grupo de cinco rapazes de classe média alta, entre 17 e 19 anos, a título de “brincadeira”.

Dias depois, o menor Gutemberg, participante do atentado, confessava: o grupo fizera uso de dois litros de álcool combustível, comprados cerca de duas horas antes do crime, especificamente para efetuar a "brincadeira".

Com queimaduras em 95% do corpo, o que lhe comprometeu a integridade e o funcionamento dos órgãos internos, Galdino não resistiu e faleceu às duas horas da madrugada, do dia vinte e um de abril (Dia do Índio).

Galdino Jesus dos Santos era indígena do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, que vive no sul da Bahia. Ocupava a função de conselheiro em sua comunidade. Chegara em Brasília no dia dezesete de abril, como parte de uma delegação composta por oito lideranças de seu povo. Com o acompanhamento da assessoria jurídica do Secretariado Nacional do CIMI, eles cumpririam a partir do dia vinte e dois de abril, uma intensa agenda de reuniões com procuradores da República, parlamentares e membros do alto escalão do Ministério da Justiça e da Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

O objetivo era buscar apoio para a solução de um imbróglio judicial criado pelo Juízo da Vara Federal em Ihéus - BA, que impedia o cumprimento de uma decisão do Tribunal Regional Federal (TRF), da 1ª Região em Brasília, que meses antes havia reconhecido à sua comunidade o direito de posse provisória sobre uma área de cinco fazendas encravadas em terras indígenas.

Diferentemente do que fora planejado, no dia vinte e dois de abril Galdino fazia a sua viagem de volta, para ser enterrado.

 

PE. RODOLFO LUNKENBEIN

 

Sacerdote salesiano, nasceu no dia primeiro de abril, de hum mil novecentos e trinta e nove (1939), em Doringstadt na Alemanha Ocidental. Veio para o Brasil em hum mil e novecentos e cinqüenta e oito 1958. Tinha 37 anos e era diretor da Missão Salesiana de Meruri, no estado de Mato Grosso. Foi assassinado no dia quinze de julho, de hum mil novecentos e setenta e seis (1976), quando a aldeia dos índios Bororo, em Mato Grosso, foi atacada por sessenta fazendeiros armados. Queriam vingar-se dos indígenas por causa de problemas de terra.

Juntamente com Pe. Rodolfo, foi assassinado também o índio Simão, e feridos outros tantos.

Rodolfo havia vivido toda sua vida em meio aos índios, procurando, com eles, resgatar a esperança de vida da tribo. De fato, antes de sua chegada à aldeia, as mulheres Bororo já não queriam gerar filhos, decretando, desse modo, o desaparecimento da tribo. Já fazia seis anos que não nascia uma única criança. Contudo, na missa de funeral de Rodolfo e do índio Simão, já se podia contar numerosas crianças.

 

PE. VICENTE CAÑAS

 

Tinha quarenta e oitenta anos de idade quando morreu. Nasceu em Albacete, Espanha, no dia vinte e dois de outubro, de hum mil novecentos e trinta e nove (1939), e veio para o Brasil em hum mil novecentos e sessenta e cinco (1965). Foi assassinado em abril de hum mil novecentos e oitenta e sete (1987), num barraco à beira no rio Juruena, Mato Grosso, por defender os direitos dos índios à sua terra, constantemente invadida por madeireiros e latifundiários.

Ele trabalhou inicialmente com os índios “beiço de pau”, após uma terrível epidemia que assolou esse grupo. Depois, com os Paresi, Miky, e desde hum mil e novecentos e setenta e sete (1977), assistia os  Enawenê-Nawê, vivendo como eles.

 

DOROTHY STANG

 

Nascida em sete de junho, de hum mil novecentos e trinta e um (1931), na cidade de Dayton, no Estado de Ohio, Estados Unidos. Dorothy veio para o Brasil em hum mil novecentos e sessenta e seis (1966). Fazia parte de uma congregação internacional da Igreja Católica – Irmãs de Notre Dame de Namur – que tem como princípio ajudar os mais pobres e marginalizados.

Sua primeira experiência foi em Coroatá (MA), onde acompanhou o trabalho dos agricultores nas comunidades eclesiais de base. Com o passar do tempo, o povo já não tinha onde plantar e precisava se submeter aos mandos e desmandos dos latifundiários. Diante da situação, muitos migraram para o estado do Pará e Dorothy acompanhou esse movimento. Aos setenta e três anos, voz baixa e mansa, andava sempre sorridente e determinada.

A Irmã Dorothy Stang foi assassinada com sete tiros, aos setenta e três anos anos de idade, no dia doze de fevereiro, de dois mil e cinco (2005), às sete horas e trinta minutos da manhã, em uma estrada de terra de difícil acesso, a cinqüenta quilômetros da sede do município de Anapu, no Estado do Pará, Brasil.

Essa breve biografia dos mártires aqui citados, dão uma clara idéia das razões pelas quais eles não deverão ser esquecidos: o profundo engajamento e compromisso com as lutas a favor dos mais necessitados, oprimidos e excluídos – os mártires das lutas sociais e politícas, eles que são certamente, mártires da fé.

 


CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Ao longo desse trabalho procurei evidenciar a Romaria dos Mártires: a sua origem, o sentido de sua denominação, a sua importância sócio-político-religiosa; o que levou a Igreja Católica à sua realização; procurei elaborar um breve histórico sobre os mártires que são lembrados e homenageados; situar razões que levam à homenagem dos mesmos; procurei registrar como tem ocorrido em Rondonópolis-MT, a sua organização, trajetos, elementos que a constituem etc.

Eu, pessoalmente, nunca imaginei a dimensão de um evento dessa natureza, ainda que venha dele participando há alguns anos, pois o meu olhar, por exemplo, ficava bastante restrito à minha manifestação de fé: acompanhando a Romaria, participando dos louvores que nela são feitos, por meio de cânticos, orações etc.

Hoje, feita a pesquisa e, a partir dela, elaborado o presente texto, tenho clareza que a sua dimensão é bem maior. E não só maior que aquele meu olhar, mas maior ainda do que o olhar que ampliei com o estudo feito.

A Romaria dos Mártires, na minha avaliação, extrapola o âmbito religioso, articulando-se aos âmbitos sócio-político, pois as reflexões que possibilita realizar também são feitas sobre problemáticas retiradas do social, em que os seus participantes são chamados não só a pensar sobre elas, mas a agir, no sentido de lutar por mudanças que se fazem necessárias para a construção de uma sociedade mais digna e justa.

Nesse sentido, avalio-a como uma romaria que apresenta características militantes, o que no âmbito do presente estudo não conseguir refleti, pois os referenciais que utilizei foi insuficiente. E aqui assinalo uma contribuição do convidado para a minha qualificação – Professor e Mestre Padre Giovane pereira de Melo, que tomo como sugestão para mim mesma como pesquisadora, considerando que pretendo aprofundar a temática futuramente, assim como deixo como sugestão para outros pesquisadores -, para trabalhar com essa perspectiva militante vislumbrada, precisaria promover um diálogo com a produção já existente sobre a Teologia da Libertação; sobre as Comunidades Eclesiais de Base; sobre o catolicismo Popular etc.; que possibilitariam, no entendimento dele, compreender uma ressignificação das romarias, se comparada, por exemplo, a Romaria dos Mártires a outras formas tradicionais de romarias.

Por outro lado, quero acrescentar à minha avaliação, que vejo a Romaria dos Mártires como uma possibilidade a mais para a humanização da sociedade em que vivemos; de rompimento com a passividade; de estímulo à construção de uma participação ativa em lutas sociais e políticas; que vejo em manifestações como essa, de forte religiosidade popular, uma maneira de motivar lutas sociais e políticas, que carecem de fé daqueles que delas participam, indicando a fé como elemento que admite inúmeros significados e, como força impulsionadora e movedora de ações engajadas, que tenham como meta mudanças e transformações sociais.  

Na realização da pesquisa encontrei muitas dificuldades. Entre elas, a pouca documentação escrita sobre as romarias. Por exemplo: Na Diocese de Rondonópolis – MT, só há registros até a 7ª Romaria dos Mártires; os dados e informações levantados no Jornal A Tribuna também ficaram aquém do que eu imaginava ali encontrar. Outra dificuldade foi a minha própria falta de tempo: tenho vários afazeres: o tempo que “sobrava” é que foi dedicado à pesquisa. Estudo; lido com as minhas atividades de mãe e de dona de casa: no quarto ano cursei várias disciplinas, entre elas a Prática de Ensino e Estágio Supervisionado, que teve muitas exigências. Possivelmente teria conseguido encontrar mais fontes, contudo, especialmente o tempo exíguo não me permitiu.

Construí e usei fontes orais, o que nunca havia feito até então. Nelas percebi uma grande riqueza de informações, mas não consegui “explorá-las” mais e melhor; também de outras maneiras, como sugeriu o Padre Giovane, procurando saber dos participantes como eles compreendem a luta e a memória dos mártires “sociais”, portanto, mais uma sugestão que deixo aqui registrada; outras fontes orais poderiam ter sido construídas e usadas, mas pessoas que teriam uma memória significativa sobre a Romaria, eu não consegui entrevistar: elas estavam sempre muito ocupadas. Consultei fontes áudio-visuais (talvez outras existam, pois sempre percebo pessoas filmando o evento, mas não tive tempo para procurá-las).

Enfrentei, portanto, muitos limites, e não só documentais e de tempo, mas também limites teóricos e metodológicos, como eu já havia alertado na introdução: era a primeira vez que eu fazia uma pesquisa com vistas à construção de conhecimentos. Ainda assim, considerando os limites com os quais lidei, elaborei a abordagem aqui contida sobre o tema e sobre o objeto de estudo que escolhi, compreendendo – e com humildade, que tal abordagem apresenta um conhecimento possível sobre a Romaria dos Mártires.

Tenho dito à minha orientadora que pretendo aprofundar o estudo ora iniciado nas fases seqüentes na minha formação, ao que ela tem expressado apoio, dizendo que na continuidade poderei aprofundá-lo, cobrindo lacunas, trazendo novos vieses, o que, aliás, convido os leitores e pesquisadores a também fazerem.

Ao tratar do tema e do objeto de estudo, deixei de abordar inúmeros elementos que constituem a Romaria dos Mártires, tais como: orações, teatralizações, comportamentos (por exemplo: o Padre Giovane lembrou-me no meu exame de qualificação que muitas pessoas fazem a caminhada com os pés no chão, sem calçá-los) etc., o que fica aberto a novas pesquisas.

Na abordagem que construí estão presentes, portanto, os meus próprios condicionamentos, o que acredito, não invalidem a sua realização, pois nossas escolhas seja do tema, do objeto de estudo, das referências conceituais, teóricas; dos métodos, das técnicas empregadas etc., serão sempre condicionadas, seja lá qual for o caminho que escolhermos!


FONTES

 

Orais

 

Ana Lúcia Alves Lacerda, entrevista realizada dia 26 de março de 2006.

Bárbara Mascarenhas, entrevista realizada dia 26 de março de 2006.

Bruno dos Santos, entrevista realizada dia 26 de março de 2006.

Daiane Alves dos Santos, entrevista realizada dia 26 de março de 2006.

Ivanildo José Ferreira, entrevista realizada dia 22 de janeiro de 2007.

José Carlos Souza Costa, entrevista realizada dia 26 de março de 2006.

Maria Beltrame, entrevista realizada dia 26 de março de 2006.

Raulina Medeiros Guedes, entrevista realizada dia 26 de março de 2006.

Welinton machado Cabral, entrevista realizada dia 26 de março de 2006.

 

Referencias

 

ARRAIS, Raimundo. Matriz, Freguesia, Procissões: o Sagrado e o Profano nos delineamentos do espaço público no Recife do século XIX. In: Projeto História, (24), São Paulo: EDUC, 2002.

BARROS, José D’Assunção. O campo da História: especialidades e abordagens. Petrópolis: Vozes, 2004.

CARDOSO, Ciro F. & VAINFAS, Ronaldo (orgs.). Domínios da História: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.

COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Texto integral. Tradução: Jean Melville. Editora Martin Claret, Coleção: A Obra-Prima de Cada Autor. São Paulo, 2002. 

HERMANN, Jaqueline apud CARDOSO, Ciro Flamarion e VAINFAS, Ronaldo (orgs.). Domínios da História: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.

LONDOÑO, Fernando Torres. Imaginária e Devoções no Catolicismo Brasileiro. In: Projeto História, (21), São Paulo: EDUC, 2000.

MARCONI, Marina de Andrade & PRESSOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1992.

RUIZ, Castor M. Bartolomé. A força transformadora social e simbólica das CEBS. Petrópolis: Vozes, 1997.

SANTOS, José Luiz. O que é cultura. São Paulo: Brasiliense, 1983.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2000.

TESORO, Luci Léa Lopes Martins. Rondonópolis-MT: um entroncamento de mão única, São Paulo: LLLMT, 1993.

VAINFAS, Ronaldo. Os protagonistas anônimos da história: micro-história. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

VIEIRA, Maria do Pilar de Araújo et alii. A pesquisa em história. São Paulo: Ática, 1998.

 

Escritas

 

FEIX, Plínio José. Os interesses sociais e a concepção política e ideológica dos trabalhadores rurais assentados do MST: estudo de caso na região de Rondonópolis – MT. Campinas: [s. n.], 2001. (Dissertação de Mestrado).

ISAAC, Paulo Augusto Mário. Educação escolar indígena Boé-Bororo: alternativa e resistência em Tadarimana. Cuiabá: Instituto de Educação, 1997. (Dissertação de Mestrado).

MARKUS, Maria Elsa. Trabalhadores rurais sem terra: “Somo nóis que é o Movimento”. São Paulo: PUC, 2001. (Tese de Doutorado)

NASCIMENTO, Flávio Antônio da Silva. Aceleração temporal na fronteira: estudo do caso de Rondonópolis-MT. São Paulo, 1997. (Tese de Doutorado).

 

On-line

 

http://arlindo_correia.tripod.com/101201.html

http://pt.wikipedia.org/wiki/Santo_Dias_da_Silva (Santo Dias)

http://www.acidigital.com/fiestas/quaresma/quaresma.htm

http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=8388 (Margarida Maria Alves )

http://www.catolico.org.br/santo_do_dia/santo.php?codigo=198

http://www.cf.org.br/natureza.php

http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=2020&eid=257

http://www.pimenet.com.br/noticias.inc.php?&id_noticia=6656&id_sessao=2

http://www.torturanuncamais.org.br/mtnm_mor/mor_mortes_exilio/mor_tito_lima.htm

http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/letters/documents/hf_jp-ii_let_01101999_elderly_po.html

 

Documentos Institucionais

 

Arquivo da Diocese de Rondonópolis-MT.

Arquivo do jornal A Tribuna de Rondonópolis.

 



[1] A categoria comunidade aqui é utilizada de acordo com o sentido que lhe á atribuído por Ruiz. Segundo o mesmo, As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) são um exemplo paradigmático do processamento e constituição deste imaginário social, de como os velhos símbolos são respeitados na sua forma e transformados nas suas significações, alterando a atuação social das pessoas e grupos sociais que vão-se “engajando na caminhada das CEBs”; passando de uma atitude socialmente passiva, alienada ou conivente com o sistema, a uma postura consciente, crítica e comprometida numa ação social e transformadora. RUIZ, Castor M. Bartolomé A força transformadora social e simbólica das CEBs. Petrópolis: Vozes, 1997.      

 

[2] MARCONI, Marina de Andrade; PRESSOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. 3. São Paulo: Atlas, 1992.

[3] Idem, p. 41.

[4] TYLOR, Edward B. apud MARCONI, Marina de Andrade; PRESSOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução, p. 41.

[5] KEESING, Felix M. apud MARCONI, Marina de Andrade; PRESSOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução, p. 42-3.

[6] FOSTER, G. M. apud MARCONI, Marina de Andrade; PRESSOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução, p. 43.

[7] MARCONI, Marina de Andrade; PRESSOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução, p. 163.

[8] COULANGES, FUSTEL. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2002, p. 40.

[9] Idem, p. 413.

[10] BARROS, José D’Assunção. O campo da história: especialidades e abordagens. Petrópolis: Vozes, 2004.

[11] CARDOSO, Ciro F.; VAINFAS, Ronaldo (orgs.). Domínios da história: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.

[12] SANTOS, José Luiz. O que é cultura. São Paulo: Brasiliense, 1983.

[13] VAINFAS, Ronaldo. Os protagonistas anônimos da história: micro-hinstória. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

[14] SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2000.

[15] VIEIRA, Maria do Pilar de Araújo et alii. A pesquisa em história. São Paulo: Ática, 1998.

[16] TESORO, Luci Léa Lopes Martins. Rondonópolis-MT: um entroncamento de mão única. São Paulo: LLLMT, 1993.

[17] ISAAC, Paulo Augusto Mário. Educação Escolar Indígena Boé-Bororo: alternativa e resistência em Tadarimana. Cuiabá: Instituto de Educação, 1997.

[18] WÜST, Irmhild, apud ISAAC, Paulo Augusto Mário, p. 71.

[19] SERPA, Paulo, apud ISAAC, Paulo Augusto Mário, p. 43.

[20] Idem, p. 44.

[21] NASCIMENTO, Flávio Antônio da Silva. Aceleração temporal na fronteira: estudo do caso de Rondonópolis-MT. São Paulo, 1997.

[22] FEIX, Plínio José. Os interesses sociais e a concepção política e ideológica dos trabalhadores rurais assentados do MST: estudo de caso na região de Rondonópolis – MT. Campinas: [s. e.], 2001, p. 28.

[23] MOURA, Carmem Lúcia Senra Itaborahi de, apud FEIX, Plínio José. Os interesses sociais e a concepção política e ideológica dos trabalhadores rurais assentados do MST: estudo de caso na região de Rondonópolis – MT. Campinas: [s. e.], 2001, p. 29.

[24] Idem, FEIX, Plínio José. Os interesses sociais e a concepção política e ideológica dos trabalhadores rurais assentados do MST: estudo de caso na região de Rondonópolis – MT. Campinas: [s. e.], 2001,  p. 31.

[25] MARKUS, Maria Elsa. Trabalhadores Rurais Sem Terra: “Somo nóis que é o Movimento”. São Paulo: PUC, 2001, p. 20.

[26] Idem, FEIX, Plínio José. Os interesses sociais e a concepção política e ideológica dos trabalhadores rurais assentados do MST: estudo de caso na região de Rondonópolis – MT. Campinas: [s. e.], 2001.  p. 37.

[27] COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Texto Integral. Tradução: Jean Melville. Editora Martin Claret, Coleção: A Obra-Prima de Cada Autor. São Paulo, 2002.  p. 40.      

[28] Idem, p. 29.

[29] Idem, p. 184-185.

[30] Idem, p. 413.

[31] HERMANN, Jaqueline apud CARDOSO, Ciro Flamarion e VAINFAS, Ronaldo (orgs.). Domínios da História: Ensaios de Teoria e Metodologia. Rio de Janeiro, 1997, p. 347.

[32] LONDOÑO, Fernando Torres. In: Proj. História. São Paulo, (21), jun. 2002. São Paulo: EDUC, p. 252.

[33] ARRAIS, Raimundo. In: Proj. História. São Paulo, (24), jun. 2002. São Paulo: EDUC, p. 176.

[34] Idem, p. 174.

[35] Idem, p. 183

1Fazem parte da micro-região de Rondonópolis – MT, os municípios de Dom Aquino, Itiquira, Jaciara, Juscimeira, Pedra Preta, São José do Povo e São Pedro da Cipa.

[37]RUIZ, Castor M. Bartolomé. A força transformadora social e simbólica das CEBS. Petrópolis: Vozes, 1997.

[38] Idem, p. 129.

[39] Entrevista feita com o Professor Ivanildo José Ferreira em 22/01/2007. Todas as demais falas atribuídas ao professor, são partes dessa mesma entrevista.

40Idem RUIZ. P.130

41ESCRIBANO, Francesc. Descalço sobre a terra vermelha. Campinas: UNICAMP, 2000.

[42] A quaresma é o tempo litúrgico de conversão, que a Igreja marca para preparar seus fiéis para a grande festa da Páscoa. É tempo para o arrependimento dos pecados e de mudar algo para tornar-se melhor e poder viver mais próximo de Cristo. Ver: http://www.acidigital.com/fiestas/quaresma/quaresma.htm.

[43] Anotações feitas pelo Pe. Giovane Pereira de Melo, a partir do roteiro de celebração dominicais. Quaresma 1997 – CNBB e outros subsídios.

[44] Entrevista feita com Éder. Dia 26/03/2006.

[45] Em 1961, três padres responsáveis pela Cáritas Brasileira idealizaram uma campanha para arrecadar fundos para as atividades assistenciais e promocionais da instituição, para torná-la autônoma financeiramente. A atividade foi chamada Campanha da Fraternidade. Ela foi realizada pela primeira vez na Quaresma de 1962, em Natal-RN, com adesão de outras três dioceses e apoio financeiro dos bispos norte-americanos. A Campanha da Fraternidade é uma atividade ampla de evangelização, desenvolvida num determinado tempo (Quaresma), para ajudar os cristãos e as pessoas de boa vontade a viverem a fraternidade em compromissos concretos, no processo de transformação da sociedade a partir de um problema específico que exige a participação de todos na sua solução. Ver: http://www.cf.org.br/natureza.php

[46] Jornal A Tribuna. Editorial: Mártires Anônimos, p. A 2, sábado/domingo, 1º e 2º de abril de 2000.

[47] Jornal A Tribuna. 14 de março de 2001.

[48] http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/letters/documents/hf_jp-ii_let_01101999_elderly_po.html.

[49] KESTERING, Dom Juventino. Bispo Diocesano de Rondonópolis.

[50] Diocese de Rondonópolis. Rondonópolis, 24 de março de 1992. Oficio nº. 2/92.

[51] Câmara Municipal de Rondonópolis - MT. Moção de Aplausos / Protocolo nº. 2879, Proposição nº. 01.

        
        

[52] MELO, Pe. Giovane Pereira (Coordenador Diocesano de Pastoral). Jornal A Tribuna, Opinião de Leitor, Rondonópolis, 09 de março de 1994.  p. A2.

[53] Idem.

[54]Bíblia Sagrada, Mt 25. 31-40

[55]Dom Osório W. Stoffel, ex-bispo diocesano, já falecido.

(*)Ana Lúcia Alves de Lacerda, 20 anos, é moradora em Rondonopolis-MT. Ela  participa da Romaria dos Mártires há 5 anos.

[56]Entrevista feita com o Prof. Ivanildo José Ferreira em 22/01/07.

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